Este PR15 é mais um dos muitos percursos existentes na serra da Freita e na área do Arouca Geopark. Este trilho leva-nos a percorrer o planalto da Freita, conhecer algumas das suas localidades, alguns dos geossítios do Arouca Geopark e ainda encontrar testemunhos da Pré-história e outras referências mais recentes. Um trilho muito agradável e cheio de história.
As bonitas paisagens do planalto da serra da Freita não passam despercebidas e deixam qualquer um encantado com a sua beleza. Aqui, perante a grande imensidão do planalto, conseguimos encontrar recantos maravilhosos e “monumentos” geológicos únicos e cheios de história. A história do nosso planeta (bem, pelo menos um bocadinho dela…).
Há cerca de 350 milhões de anos, os continentes de então começaram a juntar-se para formarem o super-continente Pangeia. Do impacto entre os blocos continentais resultou a formação de uma enorme cadeia montanhosa: as Montanhas Variscas. Os diversos afloramentos rochosos que podemos observar no planalto da serra da Freita são formados a uma profundidade de 7.000 metros e provêm do desmantelamento das antigas Montanhas Variscas, o que vem ocorrendo há 250 milhões de anos.
O planalto da serra da Freita é uma vasta superfície aplanada situada a cerca de 1.000 metros de altitude. Estas terras já foram, há muitos milhares de anos, um extenso leito marinho e o planalto da Freita é o resultado da erosão sofrida principalmente durante o último ciclo glaciário.
Este percurso de Arouca é um trilho circular que percorre o planalto da serra da Freita, com partida e chegada na aldeia de Merujal. Apesar da sua distância (cerca de 17 quilómetros), considero um trilho acessível a quem tiver alguma prática de caminhada (só tem uma subida “mais dolorosa”), e que é perfeitamente realizável numa manhã ou numa tarde (cuidado com o calor, já que o percurso é muito exposto).
Este PR15 de Arouca leva-nos a conhecer algumas das maravilhas da Freita: vamos conhecer alguns dos geossítios do Arouca Geopark, como a Casa das Pedras Parideiras, a Frecha da Mizarela ou as Pedras das Boroas do Junqueiro; vamos passar por localidades como Merujal, Albergaria da Serra, Castanheira, Cabaços e Mizarela; e ainda encontrar testemunhos de que esta região é povoada desde a Pré-história, como são o caso de alguns monumentos funerários e outras referências mais recentes (século XVII).
Ao longo do trilho (e nas estradas que percorrem a serra) é natural encontrar algum gado – essencialmente cabras e vacas da raça arouquesa (animais de origem protegida). São animais criados em liberdade pelas encostas da serra, alimentados à base de vegetação natural (o que confere à sua carne, extremamente tenra, uma sabor delicioso). Vai encontrar também alguns cães de gado (cães que guardam os rebanhos) que, normalmente, não fazem mal, mas que não gostam que nos aproximemos dos seus rebanhos. Convém estar atento e manter uma distância considerável dos rebanhos, não correr, nem fazer movimentos bruscos. Muitas vezes me perguntam se eu não encontro bichos (cobras, lobos, raposas, javalis…) durante as minhas caminhadas pelas serras e montes deste país. Sim, já encontrei estes todos e mais alguns… Aquilo que eu respondo sempre, é que este tipo de animais, normalmente, foge de nós muito antes de nos apercebermos que eles lá estavam. Os que me têm causado mais problemas são. Nas pequenas aldeias, os cães que estão soltos e saem a correr portão fora, de dentes feitos às nossas pernas. Já apanhei alguns sustos…
Este trilho circular leva-nos a conhecer algumas das belezas da Freita, as suas belas paisagens serranas e a ter contacto com as suas gentes. Sempre que possível, faço por conversar com as gentes locais – eles têm sempre histórias e saberes para nos contar.
Sendo circular, este trilho pode ser iniciado em qualquer ponto do seu percurso, no entanto, recomendo que o faça na aldeia de Merujal ou, em alternativa, um pouco mais acima, junto ao parque de campismo. Outras opções a ter em conta, será começar na praia fluvial de Albergaria da Serra (onde poderá tomar um banho no final) ou na aldeia de Castanheira, junto às Pedras Parideiras (assim, faz a maior subida do percurso logo no início do trilho).
O PR15 tem início e fim na pequena aldeia de Merujal. Esta é uma aldeia rústica que mantém algumas das suas características arquitectónicas originais. Ali ao lado, junto à M511, fica a capela de Nossa Senhora da Laje, um templo do século XVII com retábulo do altar-mor em talha dourada e branca e tecto em caixotões de madeira.
Da aldeia de Merujal, o percurso deste PR15 leva-nos até o parque de campismo e ao parque de merendas, para depois da curva da estrada, tomarmos um caminho à direita, que nos há-de levar até Albergaria da Serra, sempre “vigiados” pelo miradouro do vértice Geodésico de São Pedro Velho (1077 metros de altitude).
Aqui, depois de percorrer algumas das ruas da aldeia, cumprimentar as pessoas mais idosas que encontramos sentadas em bancos e nas soleiras das portas, vamos atravessar a ponte sobre o rio Caima. Logo a seguir passamos pela igreja de Nossa Senhora da Assunção (do século XVIII) e pelo cemitério da aldeia. Foi aqui que encontrei o Sr. Manuel (76 anos), um habitante local, que me contou a sua história e as origens da aldeia.
O Sr. Manuel explicou-me a origem da aldeia e o seu topónimo. Ao que parece, por aqui passava um via romana que ligava Viseu ao Porto. Mais tarde, terá aqui existido uma albergaria que servia de ponto de descanso. Virá daí o nome da localidade. Dessa albergaria apenas resta uma placa que agora se encontra no muro do cemitério. Por isso, por aqui conta-se que os muros do cemitério são as antigas paredes da albergaria, à qual tiraram o telhado e que a porta do cemitério era a porta da albergaria.
O Sr. Manuel, que fazia horas para ir assistir à missa, ainda me ajudou a ler e explicou a placa no muro do cemitério, bem como uma outra inscrição existente no cruzeiro. Foi um momento bem agradável e muito interessante que ficará marcado na minha memória.
Depois deste intervalo que serviu para recompor as pernas, há que continuar e seguir para o planalto da Freita. Vamos seguir por um caminho à esquerda que acompanha o rio Caima, que aqui corre encaixado no seu leito estreito e sinuoso e onde podemos observar algumas azenhas. Vamos atravessar pequenas pontes que cruzam o Caima e seguir caminho até à estrada. Neste percurso, até à estrada poderemos encontrar algumas vacas a pastar. São inofensivas, mas convém manter uma distância de segurança.
Chegados à estrada, se fizer um pequeno desvio à esquerda, estrada acima, poderá ver a poucos metros de distância uma mini-barragem. Voltando ao ponto em que atravessamos a estrada, chegamos às Pedras Boroas do Junqueiro.
As Pedras Boroas do Junqueiro, são dois enormes blocos graníticos que foram assim designados devido à sua semelhança com a côdea das boroas de milho. Estas esculturas na pedra são criadas por acção da água e do vento que, juntamente com as mudanças de temperatura e a química dos elementos vão dando origem a estas maravilhas da natureza.
Depois de admirar as Pedras Boroas é preciso continuar, cerca de dois quilómetros, por um caminho (onde também poderá encontrar vacas de raça arouquesa) até se chegar a um largo estradão de terra batida. Chegamos ao Vidoeiro. Aqui há que seguir o estradão pela direita. Vamos fazer alguns quilómetros (perto de quatro) neste estradão e há que estar atento, pois, mais à frente, vamos virar à direita por um caminho mais estreito que nos há-de levar ao Dólmen da Portela da Anta.
Aqui, em pleno planalto da serra da Freita vamos encontrar uma sepultura megalítica datada de finais do IV milénio antes de Cristo. Este monumento já aparece referenciado num documento medieval do século XIII. Este tipo de monumentos servia para assinalar o local da sepultura colectiva das comunidades pastoris, neste caso, as que habitavam a serra da Freita. Não deixa de ser curiosa esta dicotomia entre a vida e a morte neste planalto onde a natureza se renova e a vida brota constantemente.
Aqui, junto ao Dólmen da Portela da Anta, vamos seguir por um caminho à esquerda (devidamente assinalado). Vamos descer, atravessar um pequeno ribeiro e, depois, subir uma elevação (1044 metros de altitude), um grande maciço rochoso, constituído por um grande amontoado de pedras de granito. É o geossítio das Pias de Serlei. Aqui podemos encontrar diversas pias cavadas na rocha por acção do tempo, dos factores climatéricos e pela água. Estas curiosas pias, que podem ter entre 30 centímetros e um metro de diâmetro, funcionam como bebedouros naturais para a vida selvagem.
Apesar de todo o trilho estar bem sinalizado, ao atravessar as Pias de Serlei vai encontrar alguma dificuldade em localizar a habitual sinalização que aqui passa despercebida no meio de tanta rocha. Apure o olhar e esteja atento às mariolas colocadas nos pontos mais altos que nos ajudam a identificar o caminho. Não tem como se enganar. Por isso, é tão importante respeitar as mariolas quando as encontramos e não as destruir nem construir novas só pelo nosso belo prazer.
As mariolas não são apenas pedras empilhadas umas sobre as outras, não são construções decorativas, elas estão lá porque fazem sentido, estão a marcar caminhos. As mariolas são pontos de orientação que ajudam pastores e caminhantes a orientar-se e a localizarem o caminho, principalmente com condições atmosféricas adversas. Podem ter apenas duas ou três pedras ou chegar a ter vários metros de altura. Estão colocadas em pontos altos, acima da vegetação, de forma a que de um se aviste o próximo. Aproveite a chegada ao ponto mais alto, e admire a magnífica panorâmica sobre o planalto da Freita.
Descendo do amontoado granítico, vamos chegar à casa abrigo e ao entroncamento das estradas que fazem ligação a Arouca (M621), Vale de Cambra (M621) ou a Manhouce e São Pedro do Sul (M612). Atravessamos a estrada e vamos encontrar as Mamoas de Monte Calvo, sepulturas do II milénio antes de Cristo.
Desvie o olhar lá para o alto, para o Radar Meteorológico de Arouca instalado no Pico do Gralheiro, a cerca de 1100 metros de altitude. O Radar, uma torre circular com 50 metros de altura, é o terceiro e o mais moderno radar do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA). No décimo piso, existe um miradouro panorâmico, uma estrutura circular envidraçada, com uma perspetiva de 360 graus, onde, em dias de céu limpo, se pode observar para além de todo o planalto da serra da Freita, uma importante área do território nacional, com destaque para as serras da Arada, Caramulo, Estrela e Montemuro, o vale do Vouga, toda a área que vai da Figueira da Foz até ao Porto, as cidades de Aveiro, Vila Nova de Gaia e do Porto e o Oceano Atlântico entre Aveiro e Porto. O Radar Meteorológico de Arouca vai estar aberto durante o mês de Agosto de quarta a domingo (ente as 14h30 e as 17h30) e é conveniente fazer marcação com antecedência para visitar.
Segue-se agora por um caminho que nos vai levar até à aldeia de Castanheira. Na minha opinião, vai começar a parte mais dura deste trilho. A descida até Castanheira é feita por um caminho algo sinuoso com muita pedra solta onde é necessária atenção redobrada. Descemos até Castanheira onde podemos visitar o afloramento rochoso onde “nascem” pedras. É o geossítio das Pedras Parideiras. Este é um dos sítios mais emblemáticos do Arouca Geopark e um fenómeno geológico único no Mundo. Aqui existe um grande bloco granitico, com cerca de 320 milhões de anos, onde as Pedras Parideiras (granito) contêm nódulos mais escuros compostos por diversos minerais. Devido à erosão, esses nódulos mais escuros acabam por se soltar, deixando pequenas cavidades na pedra mãe. Para compreender melhor este fenómeno geológico deve visitar a Casa das Pedras Parideiras – Centro de Interpretação, onde pode assistir a um pequeno filme 3D.
Aproveitei alguma sombra junto ao Centro Interpretativo, juntamente com um grupo de alemães já com alguma idade que já ali se encontrava, para recarregar energias e fazer uma pequena pausa (porque já sabia que se seguia uma subida desafiadora…)
Depois de um breve descanso, atravessamos a aldeia de Castanheira em direcção ao ribeiro de Castanheira, através de uma zona rural, onde é preciso abrir um portão (que convém voltar a deixar fechado). Depois de atravessar o ribeiro chegamos à pior subida deste PR15. São algumas centenas de metros com bastante inclinação, e com algumas pedras, que é preciso ultrapassar para avistarmos a localidade de Cabaços. Esta subida torna-se um bocadinho violenta, quer pela inclinação do terreno, quer pelo cansaço acumulado nas pernas que já vêm com mais de 13 quilómetros. Foi aqui que o grupo alemão, que me acompanhou na travessia da aldeia, ficou para trás...
Chegados ao alto, há que recuperar o folêgo e admirar a paisagem. Com tempo limpo – e felizmente estava –, daqui conseguimos avistar a vasta planície costeira e, lá ao longe, a ria de Aveiro e o mar.
Depois o caminho segue pela direita, contornando alguns terrenos agrícolas e leva-nos até ao lugar de Cabaços nas imediações da M621. Aqui encontrei um rebanho de cabras com largas dezenas de cabeças e tive que ficar por ali um bom bocado, pois os cães que acompanhavam o rebanho vieram no meu encalço. Fingi que ia noutra direcção e atrasei ligeiramente a minha marcha. Os bichos, sempre de olho em mim, seguiram o seu caminho e o seu trabalho guiando o rebanho.
Atravessamos o lugar de cabaços, com poucas casas e onde é bem visível que é uma localidade que mantém o seu rebanho comunitário e onde se mantêm as tradições.
Depois de Cabaços, o percurso deste trilho leva-nos até à praia fluvial de Albergaria da Serra onde, se estiver calor, pode aproveitar para refrescar o corpo com um belo mergulho nas águas do rio Caima. Depois de atravessar a ponte, segue-se pela esquerda e por um caminho estreito e sinuoso que nos vai levar atá à Mizarela. Aqui, voltei a encontrar outro rebanho… Aproveitei uma sombra e fiquei a admirar o trabalho do pastor e dos cães a guiar mais umas boas dezenas de cabras.
Depois de atravessar a aldeia da Mizarela, há que fazer um novo desvio para uma breve paragem no Miradouro da Frecha da Mizarela. A Frecha da Mizarela é uma queda de água localizada junto à aldeia com o mesmo nome. Aqui o rio Caima despenha-se a mais de 75 metros de altura. Esta é a mais alta cascata de Portugal continental e uma das mais altas da Europa. Este miradouro proporciona uma magnífica panorâmica da cascata e para as íngremes encostas que a circundam, bem como para toda a exuberante paisagem envolvente onde ainda existem exemplares representativos da vegetação primitiva da serra da Freita, onde constam algumas espécies raras e protegidas.
Seguimos caminho do outro lado da estrada em direcção a Merujal. Aqui, com cuidado, tive que passar por entre o rebanho que se encontrava espalhado pela encosta da serra. Com todo o cuidado e devagar para não assustar os bichos e para não chamar a atenção dos cães, lá fui passando. Agora o caminho segue por um trilho florestal até à estrada que é necessário atravessar para regressarmos à aldeia de Merujal.
Este PR15 de Arouca – Viagem à Pré-história, é um trilho bastante interessante que nos faz conectar com a Natureza e com a história. Este trilho, para além de nos mostrar alguns dos geossítios do Arouca Geopark, leva-nos ainda a conhecer alguns pontos históricos e de interesse, conhecer as realidades rurais destas pequenas aldeias que sentem o despovoamento e observar algumas das melhores paisagens do planalto da serra da Freita. Na minha opinião, este é um dos trilhos a não perder na serra da Freita.
Recomendações
Tenha sempre em atenção a sua forma física. Tente informar-se com antecedência do estado do terreno e estude o trilho. Confirme o estado do tempo para o local para onde vai. Não se esqueça que na serra o tempo pode mudar de repente. Use roupas e calçado adequado para este tipo de actividade (e de acordo com a estação do ano). Caminhe sempre nos trilhos marcados, não só por causa do meio ambiente, mas também para sua protecção. Respeite os animais, eles estão no habitat deles, nós é que somos o intruso. Respeite e mantenha uma margem de segurança dos rebanhos e dos cães de gado. Em dias de sol quente, use chapéu e protector solar e leve água consigo. Principalmente de Inverno, tome atenção às horas para não ter que caminhar no escuro (leve sempre uma lanterna). Sempre que possível, não vá sozinho, avise sempre um familiar ou um amigo para onde vai. Não deixe lixo e, se vir algum, tente levá-lo consigo sempre que possível. Não acampe sem ser em locais próprios. Não faça barulho, respeite a natureza, relaxe e desfrute, vai ver que não há melhor actividade física.
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