Hoje trago mais um belo Hot Spot a poucos quilómetros da cidade do Porto. A pouco mais de meia hora da Invicta, encontramos um local único, de grande beleza natural e cheio de história(s): a Senhora do Salto, em Aguiar do Sousa (Paredes).
A poucos quilómetros da cidade do Porto, mas já no concelho de Paredes, na freguesia de Aguiar do Sousa, fica o lugar do Salto, vulgarmente conhecido como Senhora do Salto por ali existir uma pequena capela.
De fácil acesso a partir da cidade do Porto – na realidade, é de fácil acesso a partir de qualquer lado, devido à sua proximidade com a auto-estrada A41 –, este é um Hot Spot de grande beleza, biodiversidade e características geológicas. O lugar do Salto é um local de beleza única, onde o rio Sousa atravessa uma maravilhosa e imponente garganta com cerca de 80 metros de altura, localmente conhecida como “Boca do Inferno”, entre as serras de Pias (Valongo/Paredes, 385 metros de altitude) e de Santa Iria (Gondomar, 416 metros de altitude).
O espaço envolvente à Senhora do Salto é uma zona ambiental protegida pela sua importante biodiversidade. Faz parte da Rede Natura 2000 e é parte integrante do Parque das Serras do Porto, um parque intermunicipal com cerca de 6000 hectares, criado em 2017 e que abrange os concelhos de Gondomar, Paredes e Valongo.
O rio Sousa é um afluente da margem direita do rio Douro, tem cerca de 60 quilómetros de extensão, nasce em Friande (Felgueiras) e desagua no rio Douro, na Foz do Sousa (Gondomar), a cerca de 16 quilómetros do oceano Atlântico.
Este belo rio que durante anos alimentou as populações das suas suas margens, fazendo mover moinhos, regando terrenos e fornecendo peixe, aqui, na zona do Salto, contorce-se entre montes e serras, criando meandros de grande beleza. E apesar de parecer ter um plano de água calmo e baixo e, aqui e acolá convidar a banhos, é preciso ter muito cuidado. O rio Sousa pode ser enganador, com poços bastante fundos e com correntes fortes.
O Sousa chega ao Salto largo e sereno para aqui se transformar num rio selvagem que, entre rochas e pequenas quedas de água, atravessa uma majestosa garganta com cerca de 80 metros de altura e um quilómetro de comprimento.
Ao olharmos para este espectáculo da Natureza ficámos a pensar como é que este sítio magnífico se terá formado. Estas rochas são muitos antigas e a garganta por onde corre o rio Sousa foi esculpida ao longo do tempo e conta-nos um pouco da história do nosso planeta.
Esta rochas graníticas terão tido origem à cerca de 300 milhões de anos com a colisão dos continentes e as rochas metamórficas serão ainda mais antigas (540 a 390 milhões de anos), de quando toda esta região se encontrava submersa pelo oceano. Prova disso, são os fósseis de animais marinhos que aqui foram encontrados.
Ao longo de milhões de anos, pela erosão das suas águas, o rio foi abrindo caminho e foi marcando a paisagem, criando este magnífico desfiladeiro com escarpas quase verticais. “Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”… foi o rio que moldou e criou este magnífico cenário natural e será o rio que o continuará a mudar nos próximos milhares de anos.
A zona envolvente à Senhora do Salto, para além de ter características geológicos únicas e de ser um espaço paisagístico de grande beleza, é um local muito rico em biodiversidade, com a mais diversa fauna e flora. Aqui estão criados habitats muito próprios que suportam uma grande diversidade de espécies. Estas escarpas vertiginosas servem de habitat a algumas aves de rapina, como o Falcão Peregrino, assim como para a nidificação das Andorinhas das Rochas. Por aqui já foram identificadas espécies como a Águia de Asa Redonda, a Garça, o Guarda-Rios, a Salamandra Lusitânica, a Lontra e o Esquilo, entre muitas outras espécies.
Apesar dos eucaliptos também marcarem a sua presença por aqui, a vegetação deste local é muito rica e variada contemplando espécies pouco comuns e de grande interesse. Além de alguma flora protegida, aqui encontram-se espécies únicas em Portugal continental, bem como algumas como sendo, aqui no Salto, o único local conhecido em toda a Europa onde ocorrem.
Para além de ser um local de grande interesse e beleza natural a Senhora do Salto é também um local de peregrinação e de culto. O culto à Senhora do Salto terá tido origem numa lenda que parece ter duas versões. Segundo a lenda, um cavaleiro que perseguia o diabo, em forma de veado (ou forma de lebre, na outra versão…), não se apercebendo da altura do penhasco, saltou sobre precipício. Ao cair, apercebendo-se do abismo, evocou Nossa Senhora. Nossa Senhora aparece-lhe e diz que salte sem medo e, por milagre, cavalo e cavaleiro conseguiram saltar até à outra margem aterrando numa pedra, onde ficaram cravadas cinco covas, dizem os populares que são as marcas das patas e do focinho do cavalo... Em sinal de agradecimento, o cavaleiro mandou construir a Capela de Nossa Senhora de Salto.
É uma lenda muito semelhante à de Dom Fuas Roupinho, na Nazaré e, certamente, a muitas outras por esse país fora, mas a verdade é que a capela foi mandada construir por um emigrante e as marcas na pedra (sim, estão lá e são bem visíveis), na realidade, são “Marmitas de Gigante”, buracos originados pela erosão do rio.
Na margem esquerda do rio Sousa, no topo de uma pequena elevação vamos encontrar a capela de Nossa Senhora do Salto com uma escadaria de xisto. O templo original, do século XVIII (1723 conforme data gravada no arco no interior da capela), seria uma pequena capela – o que corresponde hoje à capela-mor – que foi posteriormente ampliada. No seu interior apresenta uma imagem da Senhora que, segundo uma outra lenda, terá aparecido numa gruta, junto ao rio e originando a construção da capela.
Junto à capela temos a Casa da Cera e o Centro de Interpretação da Senhora do Salto equipado com equipamentos interactivos que nos permitem conhecer e perceber a origem e a história deste magnífico local. Este espaço, habitualmente está encerrado, pelo que deve fazer marcação com antecedência, contactando a Loja Interactiva de Turismo de Paredes (255788952) ou através do e-mail turismo@cm-paredes.pt.
Cá em baixo, em frente a capela, descendo em direcção ao rio, vamos encontrar uma varanda debruçada sobre as águas do Sousa. É aqui que podemos observar uma laje com cinco buracos (“Marmitas de Gigante”), próximos uns dos outros, que estão associados à lenda da padroeira.
As “Marmitas de Gigante” são orifícios escavados na rocha originados pela erosão de pequenos blocos ou seixos, em movimentos circulares, transportados rio abaixo pela força da corrente.
Do outro lado do rio, no topo de uma imponente escarpa existe um miradouro (acessível pela estrada) que permite contemplar todo o local, onde está o busto do padre Joaquim Alves Correia (1886-1951), natural do lugar da Sarnada, Aguiar do Sousa. Para além de sacerdote, foi filósofo, jornalista e escritor. Distinguiu-se como resistente anti-fascista, tendo sido um dos maiores nomes da oposição ao Estado Novo, o que lhe valeu o exílio nos Estados Unidos da América.
Mesmo por baixo da imponente escarpa, a compor a beleza do local, na margem do rio podemos observar algumas construções em xisto, antigas casas e moinhos (que julgo hoje funcionar como alojamento turístico).
No local ainda existe um anfiteatro ao ar livre e um parque de merendas. Existem ainda umas construções mais recentes, onde fica o Café Santos, famoso pelas suas Feveras com ovo e queijo. O local é bastante frequentado por amantes de motos e praticantes de BTT.
Estas escarpas verticais são aproveitadas regularmente por amantes da escalada que aqui têm condições únicas para a prática da modalidade. Ao redor da Senhora do Salto existem uma série de trilhos, devidamente marcados, que permitem conhecer as aldeias vizinhas, o território e o património do Parque das Serras do Porto.
Julgo que nos finais dos anos 80 ou 90 a edilidade de Paredes tinha a intenção de construir uns passadiços que atravessariam a garganta do Sousa e que ligariam o lugar do Salto e a Torre do Castelo. A ideia parecia que tinha sido posta de parte mas, ao que parece, apenas esteve arrumada numa qualquer gaveta tendo, recentemente, voltado a falar-se nesses passadiços. Penso que já chega o mamarracho da CREP (A41) que veio desfigurar o local e perturbar o seu sossego e a beleza, julgo não ser necessário outro a “sobrevoar” o Sousa, até porque já existem caminhos que acompanham o leito do rio. Vamos ver se encontramos um antipirético para parar com esta febre dos passadiços que se tem espalhado pelo país.
O lugar do Salto é um daqueles locais que nos surpreendem. Este “cantinho” do Parque das Serras do Porto é um local cheio de beleza e força; Um local que nos fala da história do planeta e que ainda conserva uma biodiversidade única; Um local místico e relaxante.
As estreitas e altas escarpas por onde corre o Sousa, os pequenos rápidos, o som da água a correr, o cantar dos pássaros, as casas de xisto e os diferentes tons de verde compõe esta magnífica paisagem que parece retirada de uma pintura.
Este lugar de grande beleza proporciona-nos uma experiência única, relaxante e reconfortante. Aqui a Natureza ainda manda. A Senhora do Salto é um daqueles lugares que ficam gravados na memória para sempre. Uma visita obrigatória!
Coordenadas GPS:
N 41º07.71816’
W 8º26.02566’
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