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  • Foto do escritorJoão Pais

Avis: a herança da Ordem


Avis, centro histórico

Quem se aproxima de Avis consegue avistar a vila ao longe, pois a povoação está situada num cabeço granítico a cerca de 200 metros de altitude no meio de uma vasta planície. Avis é uma vila histórica do Alto Alentejo, pertencente ao distrito de Portalegre. A vila ganhou grande importância no século XIII, ao acolher uma das ordens militares mais antigas do país, a Ordem de São Bento de Avis, que aqui estabeleceu a sua sede.

Casario em Avis
Casario em Avis

Ao chegar à vila é impossível não reparar nas imponentes ruínas do Mosteiro da Ordem de Avis, no que resta da muralha que protegia a povoação e nas suas grandes torres. Parte da vila ainda conserva o seu aspecto medieval com vielas estreitas no interior daquilo que seria o seu antigo castelo e hoje caracterizada pelo seu típico casario branco com faixas coloridas de azul ou amarelo.

Uma vila que guarda um riquíssimo património histórico e arqueológico que reflectem a grandiosidade de uma importante herança.


As ruínas do Convento de Avis e um braço da albufeira do Maranhão
As ruínas do Convento de Avis e um braço da albufeira do Maranhão

As origens de Avis

A origem de Avis não é consensual, no entanto, não existem dúvidas de que a ocupação humana do território que hoje corresponde ao concelho de Avis é bastante antiga como o comprovam os diferentes monumentos megalíticos existentes espalhados pela região.

O território envolvente à vila de Avis apresenta um numeroso conjunto de monumentos megalíticos datados entre os milénios V e III a.C., construídos pelas diferentes comunidades que povoaram este território, como são os casos da Anta do Olival, a Anta da Cumeada, a Anta do Penedo da Moura e o Núcleo Megalítico da Ordem, onde se situa a Anta Grande, classificada como monumento nacional.

Avis, Porta do Anjo
Porta do Anjo

Já do período romano, cerca do século X, existem alguns registos alusivos a desvios das vias romanas até Avis, o que revela já então a existência de um núcleo populacional. Durante o período da ocupação romana a região assume uma estrutura de povoamento marcadamente rural que se mantém até aos dias de hoje.

Em Avis subsistem ainda alguns vestígios islâmicos que sustentam a teoria da presença de comunidades muçulmanas neste lugar. No interior da cerca de muralhas existem duas artérias com as designações de rua da Mouraria e travessa da Mouraria.

As suas características geomorfológicas, o relevo pouco acentuado e a confluência de diversas ribeiras, conferem a esta região características particulares que terão justificado a sua ocupação contínua desde a Pré-História. Pelo que se poderá deduzir que aquando da doação de Avis aos Freires de Évora, já aqui existisse um pequeno núcleo urbano.


A história de Avis

Avis, Torre de São Roque
Torre de São Roque

A posição nevrálgica de Avis fez desta região, durante o período islâmico, palco de disputas entre cristãos e muçulmanos. Neste período, o território de Avis desempenhava um papel importante nos corredores comerciais.

Após ter sido conquistada aos Mouros, em 1211, D. Afonso II doou este território à Milícia dos Freires de Évora, com a condição de ali erguerem um castelo, fazer crescer o povoado e construírem um convento para instalarem a sua sede.

O Mestre D. Fernando Anes, Primeiro Mestre de Avis, fundou a vila em 1214 e de imediato coordenou a construção do castelo (entre 1214 e 1223) e o repovoamento do território. A sede da Milícia foi transferida para Avis, transformando-se na Ordem Militar de São Bento de Avis que, mais tarde, daria origem à segunda dinastia de Portugal. Vai ser a partir daqui que se inicia a expansão dos domínios da Ordem.

Em 1223, D. Martim Fernandes, Mestre da Ordem Militar de Avis, outorga do foral à vila e é a partir desta altura que se terá iniciado a construção do Convento de São Bento.

Em 1512, D. Manuel I confere à vila de Avis foral novo.

A decadência da Ordem e a consequente perda de importância da vila começa em 1385, quando o seu 20º Mestre, D. João, é aclamado Rei, como D. João I e, assim, dar início à dinastia de Avis. A partir daqui a Ordem passou a ser gerida a partir de Lisboa.

Esta pitoresca vila alentejana guarda desde a sua fundação a memória da antiga e poderosa Ordem de Avis e, hoje, serve de protecção a este importante legado histórico do passado de Portugal com a preservação patrimonial e com a criação do Centro Interpretativo da Ordem de Avis.


Avis, Porta da Vila e Torre da Rainha
Porta da Vila e Torre da Rainha

A origem do nome

O topónimo da vila não está totalmente esclarecido, mas crê-se que a origem do nome Avis derive do topónimo árabe Abez. Por outro lado, Avis significa ave em latim, o que nos remete para a lenda de Avis e do seu castelo.

Segundo a lenda local, havia uns frades que andavam à procura de um local para a construção de uma fortificação quando, num monte, viram duas águias pousadas num sobreiro. Os frades consideram aquilo como um sinal e decidiram construir o castelo naquele local, a que chamaram Avis. Ainda hoje o brasão de Avis ostenta uma águia.


A Ordem de Avis

A Ordem Militar de Avis é a mais antiga das ordens militares de fundação nacional (1175) e ocupa um espaço singular na História de Portugal, por ter estado ligada à superação da Crise de 1383-1385 e ter dado o nome à segunda Dinastia.

Ordem de São Bento de Avis
Ordem de São Bento de Avis

As origens das Ordens Militares Religiosas remontam à Idade Média, ao tempo das grandes cruzadas. Após a tomada de Constantinopla, pelos Turcos, no século XI, a violência que os muçulmanos começaram a exercer sobre os peregrinos que, de toda a Europa, se dirigiam para a Terra Santa, deu origem às Cruzadas. Estas expedições religiosas e militares, nas quais participaram praticamente todos os povos europeus, sucederam-se entre os séculos XI e XIII.

Com a tomada de Jerusalém por parte dos Cruzados, no final do século XI, alguns cavaleiros, alojaram-se perto do Santo Sepulcro, e aí fundaram uma albergaria, ou hospital, destinado a ajudar e a acolher os peregrinos, ao passo que outros cavaleiros se fixaram próximo do templo de Salomão e juraram defender os lugares santos e as vias de peregrinação que conduziam à Palestina. Os primeiros deram origem à primeira Ordem Militar, conhecida como dos Hospitalares (1113), os segundos originaram a Ordem dos Cavaleiros do Templo, ou Templários (1118).

No final do século XII, um pouco por toda a Europa são criadas diversas Ordens e a Reconquista veio ajudar à criação de Ordens na Península Ibérica. As ordens monástico-militares criadas em Portugal (Ordem Militar de Nosso Senhor Jesus Cristo, Ordem Militar de São Bento de Avis e Ordem Militar de Santiago da Espada) e nos restantes reinos da Península Ibérica (Ordens Militares de Santiago, Calatrava, Montesa e Alcântara) inspiraram-se, nas ordens militares criadas em Jerusalém para defesa da Terra Santa.

A Ordem de Avis tem origem numa confraria militar, fundada em 1175, sediada em Évora, com o nome de Freires de Évora, com dependência da Ordem de Calatrava (localidade espanhola nas margens do Guadiana). Em 1211, D. Afonso II cede-lhes o lugar de Avis com o intuito de aí erguerem um castelo, povoarem a região e construírem um convento para se instalarem.

A vila de Avis é fundada em 1214, pelo primeiro Mestre de Avis, D. Fernão Anes, que deu início à construção do castelo, passando a sede da Milícia de Évora para Avis e a organização passou a denominar-se Ordem Militar de São Bento de Avis, deixando a sua dependência de Calatrava.

A grande personalidade da Ordem seria D. João, Mestre de Avis, filho ilegítimo de D. Pedro I, elevado ao trono de Portugal por vontade do seu povo após o interregno de 1383-1385. O nome da Ordem ficaria assim ligado à Dinastia de Avis, a mais notável das dinastias portuguesas, a quem se deve toda a estratégia que levou Portugal a optar por uma vocação de expansão atlântica que culminaria nos grandes descobrimentos. A partir de D. João I cessou o governo dos mestres eleitos e a Ordem esta passou a ter governadores e administradores escolhidos pela Coroa a partir de Lisboa.

A Cruz de Avis, semelhante à cruz de Calatrava, com as pontas terminando em flor de lis, em verde, foi nessa altura integrada na bandeira portuguesa, assim permanecendo durante pelo menos um século.

As ordens religiosas foram extintas pelos liberais em 1834.


O que visitar em Avis

Normalmente começa-se a visita a uma localidade pelo seu ponto alto, pois serve de referência não só para lá chegarmos mas também nos guiarmos durante a visita. Desta vez, eu fiz exactamente o contrário e deixei o carro, precisamente do lado oposto, junto à parte antiga da vila, num pequeno largo ao fundo da rua das Cisternas, bem perto de uma das torres do Castelo de Avis, a Torre de Santo António.


Pelas ruas de Avis
Pelas ruas de Avis

Assim, como eu gosto, tive que calcorrear uma boa parte do antigo casario medieval, com as suas ruas estreitas e as típicas casas alentejanas. Ao passear pela vila observe as muitas filas de laranjeiras espalhadas pelas suas ruas que, na época, darão um colorido a esta vila alentejana cheia de história. Passeie-se pela vila e descubra alguns edifícios particulares com algum interesse arquitectónico, casas nobres imponentes, algumas das quais brasonadas e algumas portas e janelas manuelinas.


Avis, Igreja da Misericórdia
Igreja da Misericórdia

A Igreja e o Hospital da Misericórdia formam um bonito e interessante conjunto. A igreja é um edifício setecentista, contigua ao antigo Hospital que assenta num arco sobre a rua. No seu interior a igreja apresenta um retábulo em mármores cinza e rosa e o altar tem um frontal em vidro mostrando Cristo morto.

Seguindo rua da Misericórdia acima, chegamos em frente à Igreja Matriz, mas antes da visita à igreja, vamos voltar à esquerda e avistar mais umas das torres do castelo, a Torre de São Roque.


Igreja matriz de Avis, Igreja de Nossa Senhora da Orada
Igreja matriz de Avis, Igreja de Nossa Senhora da Orada

Pelourinho de Avis
Pelourinho de Avis

A matriz de Avis, Igreja de Nossa Senhora da Orada, é um templo imponente, com duas torres sineiras, e foi construída depois da extinção da Ordem de Avis, já no século XV. Ao que tudo indica, terá vindo substituir um outro templo, do século XIII, esse sim construído pela Ordem de Avis, do qual já nada resta.

A igreja apresenta a cruz da Ordem de Avis na sua fachada e o escudo das armas reais. No interior podemos ver várias pedras tumulares no pavimento, respeitantes a Mestres da Ordem. Nas paredes há um interessante revestimento a azulejos policromos do século XVII.

Ao lado da igreja temos o Pelourinho da vila em mármore branco e encimado por uma águia de asas semiabertas, símbolo da vila de Avis, aludindo à lenda da fundação do castelo. O Pelourinho, de construção do século XVI, terá sido desmontado e transportado para este local em meados do século XX.


Convento de São Bento de Avis e a sua igreja
Convento de São Bento de Avis e a sua igreja

Seguindo a visita, vamos até ao centro nobre da vila, onde se situam a Câmara Municipal, a Igreja do Convento e os restos do majestoso Convento de São Bento de Avis. O primeiro grande edifício que encontrámos é o Paço do Prior-Mor, antiga residência dos Mestres da Ordem de Avis. Este edifício do século XVII possui o brasão de D. João V (já do século XVIII). O edifício teria um jardim e possibilitava o acesso ao Convento. Depois da extinção da Ordem o imóvel foi abandonado e, posteriormente, adquirido pela Câmara Municipal para instalação dos Paços do Concelho, que ali ficariam até 2018.

O Convento de São Bento de Avis foi sede de uma das mais poderosas ordens militares religiosas, com papel determinante na época medieval, quer no Alto Alentejo, quer na história de Portugal. Com o terramoto 1755 os edifícios sofreram estragos significativos, mas pelas ruínas do edifício é ainda possível adivinhar a sua grandeza.

O Convento, construído no século XIII, era constituído por claustro, dormitórios, refeitório e pela igreja. Do antigo edifício resta apenas uma pequena parte e a sua igreja. O Convento foi profundamente modificado no início do século XVII e XVIII e, mais tarde, com a extinção da Ordem o edifício foi abandonado e entrou em ruína com a sua consequente descaracterização. Neste edifício chegou a funcionar um hospital e um orfanato.

Hoje ainda existe uma parte do claustro quinhentista, a Sala do Capítulo e o refeitório. Da igreja medieval do convento já não existem vestígios, depois da remodelação do século XVII. Na actual Igreja do Convento de São Bento de Avis destaca-se, na sua fachada, o brasão com as armas de Portugal. No seu interior está a arca tumular do Mestre D. Fernando Roiz Monteiro – o último Mestre da Ordem de Avis, falecido em 1433 – e, no pavimento do templo, muitas pedras tumulares de antigos Mestres da Ordem, datadas dos séculos XVI aos finais do século XVIII. A igreja apresenta a imagem de Nossa Senhora da Orada em pedra policromada e a imagem de São Brás, em perda, ambas do século XVI. O altar-mor apresenta um majestoso retábulo em talha. Uma parte do edifício foi recuperada e, hoje, alberga a Câmara Municipal, o Centro Interpretativo da Ordem de Avis e o Museu do Campo Alentejano.

O Centro Interpretativo da Ordem de Avis está instalado numa das alas do Convento e faz-nos uma apresentação da história da Ordem de Avis e do Convento. Tem duas exposições permanentes “O sagrado e o profano” e o “Percurso cronológico pelos momentos mais relevantes da história da Ordem de Avis”. Na Sala do Capítulo e na Sala de Leitura dos Monges está o Museu do Campo Alentejano (antigo Museu Municipal) dedicado ao campo agrícola e ao montado, apresentando objectos do quotidiano e instrumentos e alfaias utilizados nas actividades agrícolas e pastoris. Dois espaços que vão ajudar o visitante a compreender melhor a história da região e a cultura das gentes locais.

Pelas ruas de Avis
Pelas ruas de Avis

Do Castelo de Avis, construído no século XIII, durante o reinado de D. Afonso II, apenas resistem três das suas seis torres originais e alguns panos de muralha, por vezes aproveitados para integrarem a construção de casas. O Castelo foi erguido aquando da instalação da Ordem de Avis nesta localidade (1214) e alvo de várias intervenções ao longo do tempo, o que demonstra o seu importante carácter defensivo. As muralhas são em alvenaria de granito e xisto, ostentando nas mais antigas aparelho em espinha, o que poderá denunciar a existência anterior de uma outra estrutura militar árabe, ou o conhecimento e a utilização deste método, vincadamente Mouro. Nas torres que compunham o castelo, podemos encontrar símbolos militares e religiosos. Ainda podemos observar a Torre de São Roque, a Torre de Santo António e a Torre da Rainha, ou Torre do Convento, com uma magnífica vista sobre a vila, esta última mesmo ao lado da Porta da Vila.

A minha viagem pelo centro histórico da vila de Avis terminou no miradouro do Mestre de Avis, não muito longe da Porta da Vila, com uma vista soberba sobre a parte nova da povoação que se vai estendendo para lá das muralhas medievais e sobre a imensa planície alentejana.


Ali perto…

A cerca de cinco minutos do centro da vila, está a Praia Fluvial do Maranhão com boas infra-estruturas, como parque de merendas, parque infantil, clube náutico, piscinas municipais, parque de campismo e café-restaurante.

Não muito longe da vila fica a magnífica albufeira da Barragem do Maranhão. A barragem do Maranhão foi construída na ribeira de Seda entre 1952 e 1958. Esta foi uma das primeiras barragens a ser construída no nosso país. A barragem inicialmente esteve projectada para ser construída junto à vila de Avis, onde hoje se situa o clube náutico. Junto à barragem existe um miradouro com excelente visibilidade para o enorme plano de água.

Um pouco por todo o concelho de Avis existem diversos monumentos megalíticos. A cerca de 18 quilómetros da vila de Avis, em direcção a Pavia, junto à Herdade da Ordem, fica o Núcleo Megalítico da Ordem, uma necrópole megalítica com sete monumentos onde se inclui a Anta Grande da Ordem, monumento nacional desde 1910.

Não muito longe dali, perto da ribeira de Seda, num local bucólico, fica o Moinho do Duque, um moinho de água, provavelmente construído no século XVIII, que conta com moinho, açude e a casa do moleiro.

Já seguindo para norte da vila de Avis, seguindo pela EN 370, depois de atravessar a ponte da localidade de Benavila, fica a Ermida de Nossa Senhora de Entre-Águas, um templo do século XV, provavelmente construído sobre um outro de origem romana. A Ermida apresenta uma lápide funerária de origem romana e no seu interior podemos ver várias sepulturas no seu pavimento. A zona possui vários vestígios da presença romana na região, como a antiga ponte, submersa pela barragem.

Já em Ervedal, a cerca de oito quilómetros de Avis, temos uma bonita ponte pênsil que faz lembrar a Ponte 25 de Abril, em Lisboa (em versão mais reduzida). Um projecto do engenheiro Edgar Cardoso, elaborado em 1957 tendo sido concluída no início da década de 60 do século passado, o que faz da Ponte de Ervedal, provavelmente, a ponte pênsil mais antiga do país. A ponte faz a ligação das duas margens de um dos braços da albufeira do Maranhão, tem 140 metros de comprimento e apenas três de largura (só permitindo o trânsito num sentido de cada vez). Originalmente, a ponte tinha um tabuleiro em madeira, tendo ficado interdita em 1985 devido a um incêndio que destruiu parte do seu pavimento. A Ponte de Ervedal esteve dez anos a funcionar apenas como passagem de peões e de gado e, em 1996, a ponte foi reforçada e recuperada, tendo o município de Avis convidado o gabinete de Edgar Cardoso para a reabilitação da ponte. Dada a semelhança entre as duas pontes, os populares da aldeia dizem, por graça, que se trata de uma maquete para ensaios da Ponte 25 de Abril, já que as datas de construção serem muito próximas.

Para os amantes das caminhadas, a cerca de três quilómetros da pequena povoação de Aldeia Velha, na ribeira de Santa Margarida, existe um espaço de grande beleza com uma pequena queda de água, designado por Pego do Inferno. Por falta de tempo não fui à procura do local mas penso que não esteja sinalizado.


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