Falar do nordeste transmontano é falar de gente simples, simpática, lutadora e trabalhadora. É falar de terras férteis, do vale do Douro, do Tua e do Sabor. É falar de aldeias praticamente abandonadas devido à emigração ou da fuga para as grandes cidades do litoral. É falar de uma terra rica em história e em paisagens de cortar a respiração.
Após hora e meia de carro por auto-estrada (A4) e via rápida (IC5), Linha de Terra chegou àquele que seria o ponto de partida desta road trip: Alfândega da Fé.
Ao percorrer a estrada que nos leva até Alfândega da Fé é visível (e bonito) a grande extensão de olivais e amendoeiras. Por aqui a agricultura ainda é a principal actividade económica, nestas terras com gentes que sempre souberam moldar o terreno e fazer da terra o seu sustento, como é o caso da castanha, do azeite, da cereja, da amêndoa, bem como dos típicos fumeiros e do queijo.
Confesso que a paragem em Alfândega da Fé, inicialmente, seria apenas para tentar comprar cerejas… Mas houve algo nesta vila do distrito de Bragança que me chamou a atenção; primeiro a sua zona verde e, depois, a quantidade de obras de arte pública existentes na vila.
Alfândega da Fé foi habitada desde tempos imemoriáveis, consta que os Árabes vieram para cá no século VIII e lhe atribuíram o nome de Alfandagh. Mais tarde, aquando das lutas pela reconquista cristã, acrescentaram-lhe a palavra Fé. Foi terra com alguma importância durante a ocupação muçulmana, mas pelos vestígios arqueológicos encontrados, sabe-se que o território já era habitado muito tempo antes.
Ao percorrer as ruas do centro da vila apercebi-me que existem dois percursos/roteiros muito interessantes: o Roteiro da História, onde ficamos a conhecer a parte antiga da vila onde, em tempos, se localizava o Castelo (hoje apenas resta um miradouro) e o Roteiro da Arte pública, constituído por esculturas, pinturas em azulejo e grafitis que podemos encontrar em diversos espaços públicos da vila.
Do antigo Castelo mandado construir por D. Dinis, em 1320, já não há vestígios; apenas um largo com o seu nome e um miradouro. Calcula-se que o largo ocupe o que terá sido o terreiro onde ficariam a casa da Câmara, a cadeia e o poço de água. A partir do século XVI, o Castelo foi perdendo a sua importância defensiva e toda a estrutura se foi degradando. Como era comum nestas situações, um pouco por todo o território nacional, parte das pedras do Castelo foram utilizadas para as novas construções e as suas fundações foram sendo soterradas pelo casario que ali foi crescendo.
É na zona mais antiga da vila que encontramos a Torre do Relógio (construção do século XVI), a bonita Igreja da Misericórdia (século XVII) e a Igreja Matriz, localizada naquela que terá sido a primeira zona de expansão extramuros do antigo Castelo. Apesar do seu aspecto exterior não evidenciar grande antiguidade, devido a sucessivos restauros, a sua construção é do século XVI, estando documentada desde 1540, embora se saiba que a vila já possuía Igreja Matriz, dedicada ao mesmo orago, São Pedro, em 1295. Alfândega da Fé apresenta ainda algumas Capelas dos séculos XVII e XVIII, solares e casas brasonadas.
Cerejas compradas (e bem boas que eram…), era altura de seguir viagem em direcção aos lagos do rio Sabor, uma magnífica albufeira proporcionada pela barragem do Baixo Sabor com excelentes paisagens de cortar a respiração.
A barragem do Baixo Sabor foi construída em alternativa à barragem prevista para Vila Nova de Foz Côa e que iria submergir as gravuras rupestres. Assim, com a construção desta barragem, foram criados três grandes lagos (o Lago de Cilhades, o Lago do Medal e o Lago dos Santuários) com cerca de 70 quilómetros de águas cristalinas, desde a barragem do Baixo Sabor até à foz do Azibo. São grandes lagos, ligados entre si por gargantas e penhascos numa paisagem maravilhosa, que formam um verdadeiro santuário da vida selvagem e nos oferecem um horizonte de cortar a respiração. Aqui (ainda) não há praias fluviais, não há unidades hoteleiras, não há (muitos) barcos na água, não multidões a fazer trilhos (ainda não há trilhos…). É um território livre e por explorar, uma terra praticamente selvagem. Assim se espera que continue por muito tempo para deleite de quem por aqui passa.
Recomendo uma visita ao santuário do Santo Antão da Barca (em Parada, nos limites do concelho de Alfândega da Fé, quem segue para Mogadouro – IC5) com excelentes vistas sobre o Sabor. A Capela original, do século XVIII, foi traslada praticamente na íntegra do seu antigo local, um pouco mais abaixo, que com a construção da barragem submergiu todo aquele espaço. Foram recuperadas as pinturas murais existentes na Capela “antiga” e foi feita uma réplica da Fonte do Mergulho que existiu no anterior espaço e que também já não era a original.
Após contemplar esta magnífica paisagem que não nos deixa indiferentes, segue-se viagem até Mogadouro, mas só de passagem já que a visita a esta vila ficará para mais tarde. Ali, deixamos o IC5 e seguimos pela nacional 219, passamos mesmo ao lado do Aeródromo de Mogadouro para, um pouco mais à frente, virar à direita em direcção a Penas Roias e ao seu Castelo.
Mesmo antes de chegar à aldeia, passa-se por um parque de merendas e pelo acesso à barragem de Bastelos, um aproveitamento da ribeira com o mesmo nome. É um parque aprazível para descansar ou para um piquenique com vista para o Castelo lá no alto.
A pequena aldeia de Penas Roias dispersa-se à volta da Igreja de São João Batista, junto à qual podemos encontrar um sarcófago medieval, provavelmente do período entre os séculos XI e XIV, como podemos ler numa placa ali ao lado.
O Castelo de Penas Roias, do qual apenas resta uma torre, foi construído no século XII pela Ordem do Templo, após D. Afonso Henriques ter doado este território a esta ordem militar. Mais tarde, Penas Roias terá tido uma muralha defensiva da qual já não existem vestígios. Com a extinção da Ordem do Templo, o Castelo passou a ser posse da Ordem de Cristo e, mais tarde, foi pertença dos Távoras.
Este Castelo foi uma das mais importantes fortalezas medievais na defesa raiana em terras de Trás-os-Montes, tendo tido um papel importante durante no período da constituição da nacionalidade portuguesa perante o Islão e também face ao vizinho reino de Leão. Juntamente com os castelos de Algoso, Bragança, Miranda do Douro, Mogadouro Outeiro de Miranda e Vimioso formava uma forte linha defensiva.
Crê-se que muito anterior à fundação do Castelo terá existido um outro povoado fortificado, devido aos vestígios encontrados no local, incluindo um abrigo rupestre, a Fraga da Letra, que existe uns metros abaixo do Castelo.
Actualmente, do Castelo original, apenas resiste a sua torre de menagem, em avançado estado de ruína.
Penas Roias
A viagem prossegue em direcção à povoação de Algoso, já no concelho de Vimioso. É necessário voltar atrás e regressar à nacional 219. São cerca de doze quilómetros até encontrar a indicação de que chegamos à localidade. Ainda antes de chegar a Algoso atravessamos a ponte sobre a ribeira de Angueira onde se pode ver o Castelo, lá no topo, encavalitado num promontório rochoso a quase 700 metros de altitude. Vale a pena fazer uma paragem.
No centro de Algoso está a bonita Igreja Matriz de São Sebastião, um templo Românico com armas reais e torre sineira, que terá sido construída entre os séculos XVI e XVII. A encimar a sua fachada pode-se observar a cruz dos Cavaleiros de Malta. Existem ainda três Capelas: a da Misericórdia, logo atrás da Matriz e, ao fundo da rua, a de São Roque (século XVII), um pouco mais ao lado da Matriz fica a Capela de São João.
Logo à frente da Matriz, chega-se ao largo com o Pelourinho de Algoso, uma estrutura em cantaria de granito datada do século XVI. Cravada numa das suas faces ainda é possível ver uma argola de sujeição. A encimar o pelourinho, numa das faces, estão as armas de Portugal e uma esfera armilar.
Em frente ao pelourinho podemos observar uma casa com as armas de Portugal que terá sido o edifício dos Paços do Concelho e, ali ao lado, as ruínas do solar dos Távoras.
Seguimos em direcção ao Castelo de Algoso e à Capela de Nossa Senhora do Castelo ou de Nossa Senhora da Assunção, e é lá no alto que os nossos olhos se extasiam com paisagem de tamanha beleza.
O Castelo de Algoso, uma construção do século XIII, domina todo o vale com a ribeira de Angueira a correr lá no fundo, destacando-se da paisagem que o rodeia de forma inconfundível. O Castelo terá sido construído por Mendo Rufino (um senhor local e apoiante da causa de D. Afonso Henriques contra a sua mãe e que no século XII teve grande protagonismo por estas terras de Trás-os-Montes), que o terá doado a D. Sancho I em troca das terras de Vimioso. Em 1224, D. Sancho II concede o Castelo de Algoso aos cavaleiros da Ordem do Hospital, que ampliaram e reforçaram a fortificação, ali permanecendo durante séculos.
Os espanhóis empreenderam diversas investidas e saquearam estas terras, chegando mesmo a incendiar Algoso que sempre conseguiu resistir sem ser ocupada.
Existem vestígios arqueológicos de que este local terá sido povoado muito antes da construção do Castelo. Registam-se materiais do Calcolítico, nomeadamente moldes de fundição de machados de cobre, da Proto-história e do período tardo-romano.
Do Castelo podemos observar, lá no fundo, sobre a ribeira de Angueira, a bonita ponte romana de Algoso com os seus três arcos. Junto à ponte ainda é possível observar parte da calçada romana que ligava as povoações fortificadas de Penas Roias e Algoso.
Mesmo ao lado do Castelo, fica a Capela de Nossa Senhora do Castelo, ou de Nossa Senhora da Assunção, uma Capela simples, construída no século XVII, à qual está ligada uma das várias lendas de Algoso: a lenda da Senhora do Castelo.
Segundo se conta, ali vivia um lavrador que tinha umas terras mesmo junto ao Castelo. Um dia foi lavrar as suas terras levando consigo o filho, ainda bebé, que deixou abrigado debaixo de uma fraga. Quando acabou de lavrar e foi buscar o filho, não o encontrou. Depois de procurar por ali perto, apareceu-lhe um crocodilo que tinha engolido a criança. Aflito, o lavrador fez a promessa de que se o seu filho saísse vivo da barriga do crocodilo, ele mandaria erguer ali uma Capela em honra de Nossa Senhora. O lavrador pôs-se em cima do animal, saltando em cima dele e, dando-lhe com uma machada, obrigou o crocodilo a vomitar a criança viva e sem um arranhão. Após matar o corpulento animal, o lavrador tirou-lhe a pele que, ainda hoje, se encontra pendurada numa parede da Capela junto ao Castelo…
Não pude confirmar a existência da pele de crocodilo na Capela, pois esta estava encerrada, mas consta que ainda lá está.
Algoso
Era hora de continuar viagem e a rota previamente traçada indicava Miranda do Douro como o próximo destino. Era necessário voltar à estrada nacional para continuar em direcção a Vimioso por mais três quilómetros, para depois virar à direita para o Vale de Algoso. Pouco depois da saída da nacional, voltamos a atravessar a ribeira de Angueira e encontramos o Parque de Merendas de Uva. Foi aqui que Linha de Terra fez um piquenique no primeiro dia desta viagem. Um local agradável, com muita sombra, junto à ribeira, com mesas e assadores para apoio. Existe um bar e casas de banho, mas que estavam encerrados. O local, apesar de agradável e de dar para tomar banho, parecia um bocado abandonado, embora se notasse que as ervas tinham sido cortadas há pouco tempo (talvez, ainda contingências da pandemia…).
Seguiu-se caminho, por estradas secundárias em direcção a Miranda do Douro, passando pelos lugares de Uva, Granja e São Pedro da Silva até se atingir novamente o IC5 e a nacional 221 que nos leva até Miranda do Douro. Ao chegar a Miranda do Douro deparamos com as placas das localidades (e dos nomes das ruas) escritas em português e mirandês. A língua mirandesa é um idioma que deriva do Latim, com estatuto de segunda língua oficial em Portugal desde 1999. É falada por menos de quinze mil pessoas, grande parte nas aldeias de Miranda do Douro, Vimioso, Mogadouro, Macedo de Cavaleiros e Bragança.
Mas antes de percorrer as ruas do centro histórico de Miranda do Douro, havia uma outra paragem: o miradouro de São João das Arribas.
O Parque Natural do Douro Internacional abrange a área em que o rio Douro constitui fronteira entre Portugal e Espanha, abrangendo os concelhos de Miranda do Douro, Mogadouro, Freixo de Espada à Cinta e Figueira de Castelo Rodrigo.
Era então, altura de passar por Miranda e seguir em direcção a Aldeia Nova ou Aldinuoba, em mirandês, pois é aqui perto que existe um miradouro espectacular. Aqui, nos seus primeiros quilómetros em território nacional, o Douro corre, apertado, em profundos vales talhados na rocha, existindo escarpas que chegam a atingir os 700 a 800 metros de altura o que tornam esta magnífica paisagem única (e, por vezes, vertiginosa).
No fim da aldeia há que seguir por um estradão em terra para chegarmos à ermida de São João das Arribas. São cerca de 900 metros para ter uma vista soberba sobre o rio Douro que corre, lá no fundo, perfeitamente encaixado entre escarpas de cortar a respiração. Contornando a pequena ermida, existe um pequeno caminho que nos leva mesmo até à extremidade do precipício sem qualquer protecção (não aconselhável a quem tiver problemas com alturas, já que quando se olha lá para baixo a sensação é, no mínimo, estranha). São várias dezenas de metros de “parede” quase na vertical que transportam o nosso olhar até ao leito do Douro. Impressionante!
Depois de um pequeno descanso, há que continuar viagem em direcção a Miranda do Douro (Miranda de L Douro). Estacionado o carro junto à entrada do centro histórico, era altura de percorrer as ruas da cidade a pé.
Não se sabe muito bem quando começou o povoamento de Miranda do Douro, mas sabe-se que foi ocupada pelou mouros nos começos do século VIII e o seu Castelo já existia aquando da formação do Condado Portucalense (1095), tendo sido restaurado a mando de D. Afonso Henriques no século XII do qual, hoje, apenas existe a sua torre de menagem e alguns panos de muralha que durante anos serviu de defesa contra as investidas de leoneses e castelhanos. O Castelo foi reforçado por D. Dinis e, mais tarde, por D. João IV. Daí para cá, Miranda do Douro andou quase sempre em guerra com os espanhóis. Na Guerra dos Sete Anos, com a explosão de um paiol de pólvora (1762), parte da cidade ficou destruída. Recentemente, foram descobertas algumas partes do Castelo que estavam subterradas. São bem visíveis as escavações ao lado da torre de menagem. E depois, vieram as invasões francesas…
A majestosa catedral de Miranda do Douro, construída no século XVI, apresenta-se grandiosa com as suas duas torres e uma abóbada de granito. A catedral, mandada construir por D. João III, é o maior templo religioso da região de Trás-os-Montes e implicou a destruição da antiga Igreja de Santa Maria, um tempo erigido durante o reinado de D. Dinis, no século XIV.
A catedral, no seu interior, é bastante rica de talha dourada e retábulos. O altar-mor apresenta um retábulo renascentista composto por 56 imagens bíblicas em alto-relevo. A catedral conserva o bonito órgão de época joanina e é também conhecida por guardar um ícone da cultura religiosa popular, o Menino Jesus da Cartolinha, datado de meados do século XIX, que simboliza uma lenda que remonta à Guerra da Restauração (século XVII). Conta a lenda que, em 1711, o exército castelhano invadiu Miranda do Douro. Quando a cidade se encontrava cercada pelos castelhanos, esperando por reforços que tardavam em chegar, um rapazinho, vestido de fidalgo, terá andado a percorrer as ruas da cidade de espada em punho, atiçando a coragem dos seus habitantes, paralisados de frio, fome e medo, para fazerem frente aos espanhóis que cercavam a cidade. A criança avança intrépida contra os espanhóis descendo encosta a baixo aos berros. O povo, armado de foices, gadanhas, varapaus e algumas espingardas terá seguido o menino enquanto o inimigo dá em retirada. Terminada a batalha, depois da cidade libertada, procurou-se a criança por todo o lado, mas esta tinha desaparecido. Os mirandeses consideraram que se tratara um milagre e mandaram esculpir uma imagem do Menino Jesus vestido de fidalgo e colocaram-no na catedral.
Mesmo ao lado da catedral existe um miradouro (parte dele em obras) com uma vista ampla sobre o Douro e sobre Espanha, na outra margem. Atrás da catedral fica o antigo Paço Episcopal (também em obras) que terá ardido pouco depois de ter sido construído (século XVIII), restando apenas o andar térreo com uma arcada. E, logo ali ao lado, fica a biblioteca municipal que se encontra instalada no antigo Convento dos Frades Trinos (século XVII), também conhecidos por Frades Descalços da Ordem da Santíssima Trindade, que começaram a aparecer no Nordeste Transmontano, por altura do ano de 1474.
Não deixe de calcorrear as ruas empedradas da cidade e admirar algumas habitações medievais e antigos solares. No largo D. João III, junto à Câmara Municipal, pode visitar a Igreja da Misericórdia e as estátuas em homenagem à tradicional capa de honra, feita em burel e ricamente decorada com bordados. Depois de visitar o Museu da Terra de Miranda, desça a rua até à antiga Porta da Cidade. Se tiver tempo, passeie pelo aprazível parque urbano do rio Fresno e desça até à beira Douro, admire a barragem de Miranda e, se já houver essa hipótese, dê um passeio de barco pelo Douro Internacional.
Infelizmente, não tive oportunidade de ver as danças dos Pauliteiros, mas Miranda do Douro é uma cidade muito agradável, cheia de história e de cultura, que vale a pena visitar. No concelho de Miranda do Douro encontram-se dois dos maiores empreendimentos hidroeléctricos portugueses, ambos no Douro Internacional, a barragem de Miranda (iniciada em 1956) e a barragem do Picote (1954). E era precisamente na aldeia de Picote a próxima paragem.
Miranda do Douro
Retomamos a estrada nacional 221 até Cércio, para depois seguirmos a municipal 1126. Cércio, terra onde foram criados os Pauliteiros de Miranda, em 1945, apresenta algumas casas típicas em pedra e uma bonita Igreja Matriz. Seguindo estrada fora, já fora da localidade, encontramos a bonita Capela de Santa Marinha de Cércio, que apresenta cinco pilaretes de granito em frente à sua porta, fazendo lembrar um conjunto de menires. Terá sido à volta desta Capela que existiu a primitiva povoação de Cércio, tendo sido identificados, à volta do templo, vários materiais arqueológicos que remetem para o século IX a.C.
Seguindo estrada fora, chegamos à bonita aldeia de Picote (Picuote) com as suas casas de pedra e onde também se fala a Língua Mirandesa. Somos logo chamados à atenção para o facto pelo nome das ruas estarem escritos nas duas línguas.
Picote é uma aldeia tipicamente transmontana, situada em pleno Planalto Mirandês, mesmo no alto das majestosas arribas do Douro, com as suas casas de pedra e os bancos junto às portas das casas. Aqui ainda se diz que os burros de Miranda saem todos os dias para os pastos. Eu não vi nenhum…
Recomenda-se uma volta pelo emaranhado das ruas da aldeia e pelo seu casario em pedra, aqui e ali recortados por pequenas hortas onde ainda se podem ver as cegonhas ou picotas para tirar água dos poços. Procure pela Igreja Matriz, com orago a São João Baptista e, logo ali ao lado, está o berrão de Picote. Os berrões são esculturas zoomórficas que representam porcos, touros e javalis. Estas esculturas, da Idade do Ferro e da época romana (século IV a.C a II d.C), são em rocha granítica e expressam sempre o carácter de macho, com órgãos sexuais bem demarcados. Em Portugal temos vários exemplares em Trás-os-Montes e na Beira Alta (já aqui falámos deles quando visitámos Castelo Mendo). A estas esculturas têm sido atribuídas várias funcionalidades, tais como guardadores de túmulos, divindades para dar protecção ao gado ou marcadores territoriais. O berrão de Picote foi encontrado em terrenos próximos da aldeia, e pensa-se que terá sido um ídolo adorado por povos antigos que habitaram a região.
Merece ainda uma visita a Capela de Santo Cristo, em estilo românico, que desempenhou o papel de Igreja paroquial até à construção do actual templo.
Depois da visita à aldeia, tempo uma ida ao miradouro da Penha do Puio. Este miradouro, de arranjo moderno, fica no alto de uma escarpa das arribas, 200 metros acima das águas do Douro. Na laje granítica do miradouro foram encontradas gravuras da Idade do Ferro, nomeadamente o Caçador de Picote – um boneco tosco empunhando um arco – tente encontrá-lo… E, se ainda lhe sobrar tempo, ou se for um apreciador destas coisas, dê um salto à barragem do Picote (são cerca de seis quilómetros).
Picote
Retomamos a nacional 221 em direcção a Mogadouro, onde passamos por Sendim e o seu grande aglomerado de casas. Possui uma interessante Igreja Matriz e algumas casas típicas em pedra. Mais à frente, novo desvio para uma breve visita à vila de Bemposta (que também tem uma barragem a seis quilómetros do centro da vila…). Pelas suas ruas estreitas, podemos observar algumas casas em pedra, o Pelourinho da vila, a Capela de Nossa Senhora da Imaculada Conceição e a Igreja de Bemposta.
Agora é altura de “apanhar” o IC5 e rumar em direcção a Mogadouro (caso opte por não visitar Bemposta, à saída de Sendim pode entrar no IC5 em direcção a Mogadouro).
Mogadouro é uma vila do distrito de Bragança, fica no Planalto Mirandês, entre os rios Douro e Sabor. A vila é bastante agradável, possuindo espaços amplos e ajardinados. A vila tem nitidamente uma parte mais antiga – a zona histórica –, e uma parte mais moderna e residencial. Apesar de o concelho apresentar vestígios de ocupação desde tempos pré-históricos, calcula-se que Mogadouro seja de origem árabe, mas por aqui terão passado Celtas, Visigodos e Romanos.
Após afirmação do Reino de Portugal, no século XII, D. Afonso Henrique manda construir o Castelo de Mogadouro. No século XIII, D. Dinis doa as terras de Mogadouro aos cavaleiros templários que por lá ficaram até serem extintos, em 1312, por bula papal de Clemente V. Com a extinção desta ordem militar, foi criada uma outra, a Ordem de Cristo, que assume a posse de Mogadouro. Mais tarde os Távoras – uma família nobre que teve uma grande influência no desenvolvimento cultural e económico da região –, tomam conta de Mogadouro e por lá ficaram até ao tempo do Marquês de Pombal, onde caíram em desgraça, viram os seus bens confiscados e foram mortos, tendo o seu património ficado ao abandono.
Construído num pequeno morro, o Castelo de Mogadouro já só conserva a sua torre de menagem e alguns panos da antiga muralha. Na segunda metade do século XII, os Templários construíram a torre de menagem, assente num afloramento rochoso. A partir do século XV a família Távora transforma o Castelo na sua residência palaciana até ao ano de 1759, data em que os seus bens são confiscados a favor da coroa.
Junto ao Castelo, fica a Matriz, Igreja de São Mamede, que terá sido construída no século XVI, no local de uma outra mais pequena, muito provavelmente românica. A torre sineira terá sido construída posteriormente, no século XVII. Para além dos retábulos de talha dourada, o templo apresenta esculpidos os brasões dos Távoras e da Ordem de Cristo. Do outro lado do Castelo, fica a Igreja da Misericórdia (século XVI) e o Pelourinho de Mogadouro, uma obra quinhentista, simples e rústica. Percorrendo as ruas estreitas em redor do Castelo ainda podemos observar algumas casas antigas em pedra.
Já cá em baixo, junto ao centro da vila, temos o Convento de São Francisco, uma obra do século XV. Crê-se que a sua Igreja tenha sido construída depois, já no século XVII. O edifício do Convento já não é o original, já que este foi vítima de dois incêndios que o destruíram. Hoje alberga os Paços do Concelho.
Depois de um passeio pelo Parque da Vila era altura de seguir a rota em direcção a Torre de Moncorvo. Saímos pelo IC5 para, mais à frente, optarmos pela nacional 220. São cerca de 40 quilómetros por estrada de serra com belas paisagens. Montes e vales remendados, aqui e acolá, por grandes pedaços de olival e de amendoeiras que nos surpreendem praticamente a cada curva da estrada. Mais perto de Torre de Moncorvo, os pinheiros (e os eucaliptos) começam a fazerem-se notar na paisagem.
Conhecida como a Capital das Amendoeiras do norte do país (rivalizando com o Algarve), Torre de Moncorvo, apesar de estar a mais de 100 quilómetros da sua sede de distrito, ainda pertence ao distrito de Bragança. Esta é uma vila com muita história e muita coisa para ver, dada a sua importância desde a Idade Média.
A origem de Torre de Moncorvo perde-se na história do tempo e terá raízes medievais. Pensa-se que terá sido um importante senhor da época (século XI), Mendo Curvo, que junto à serra de Reboredo terá construído uma casa com uma torre para sua morada. Segundo costume daqueles tempos, os aldeões pobres da região que viviam isolados, em busca de protecção e abrigo de um rico proprietário, foram mudando-se para junto da torre e assim, se terá formado a primeira povoação. Passado algum tempo, terá aumentado ainda mais com os moradores de Vila Velha de Santa Cruz da Vilariça a mudarem-se também por falta de condições de salubridade.
O certo é que, em 1285, por vontade de D. Dinis, no âmbito da criação das chamadas “vilas novas”, um processo iniciado por seu pai, D. Afonso III, é criado o concelho de Torre de Moncorvo em detrimento de Santa Cruz da Vilariça. O seu castelo, entretanto destruído e do qual apenas restam alguns vestígios, datará dessa altura. Sabe-se que foram várias as fases de reconfiguração e destruição da fortaleza medieval. Existem registos, a partir do século XVI de que o Castelo estaria em decadência e, já no século XIX, terá sido demolido o que restava. Hoje, tenta-se reconstruir e manter o pouco que resta da fortaleza e das suas fundações, bem como da sua muralha defensiva.
Relacionada com tudo isto (ou não…) existe a Lenda de Moncorvo. De acordo com a lenda, há muitos séculos viveu naquela região um homem chamado Mendo ou Mem. Embora alguns afirmem que se tratava de um poderoso senhor, a lenda faz dele um pobre lavrador que habitava uma choupana com sua mulher, não muito longe do monte Reboredo. Certo dia, o lavrador achou um tesouro enterrado sob um penedo. Vendo-se, de repente, tão rico pensou em contar o sucedido a sua esposa. Contudo, Mendo era desconfiado e achou que ela não seria capaz de guardar tão importante segredo. Então decidiu por a mulher à prova contando-lhe que tinha visto um corvo parir um par de filhotes e para ela guardar segredo. Sem se conter, a mulher contou a história à vizinha mas, em vez de dois filhotes, disse que tinham sido quatro. De vizinho em vizinho - e como quem conta uma história, acrescenta-lhe um ponto -, a história foi-se espalhando e, em pouco tempo, toda a gente de região conhecia a história com versões diferentes. Mendo decidiu esconder o seu segredo de todos e, para isso, construiu uma grande torre onde passou a morar para defender o seu tesouro, tendo ficado conhecida como Torre do Mendo do Corvo.
Ao percorrer as ruas da vila, ninguém fica indiferente perante a imponente igreja Matriz de grandes dimensões. A Basílica de Nossa Senhora da Assunção, cuja construção teve início no século XVI, tem cerca de 20 metros de altura e terá demorado perto de 100 anos a ficar pronta. De exterior bastante trabalhado, o seu interior é riquíssimo: possui pinturas a fresco, retábulos barrocos de talha dourada, grupos escultóricos de evangelistas e doutores da Igreja, bem como um valiosíssimo tríptico flamengo alusivo a Santa Ana. A Igreja possui ainda um valioso órgão datado de 1778, localizado no coro, bem como um numeroso património móvel, cujas peças mais relevantes se encontram em exposição no Museu de Arte Sacra de Torre de Moncorvo.
Deixei o carro no centro da vila, no seu largo bem característico de calçada portuguesa e com um chafariz filipino no centro e parti à descoberta das ruas do núcleo medieval. Entre magníficos solares e elegantes capelas podem-se observar algumas casas tradicionais. Fui à procura da Porta da Vila, ou Porta de Nossa Senhora dos Remédios, com uma pequena capelinha por cima. Logo ao lado, nas traseiras da Câmara Municipal fica a Igreja da Misericórdia, um templo do século XVI que, na sua fachada, apresenta dois medalhões representando S. Pedro e S. Paulo. À esquerda do templo encontra-se a casa da Misericórdia, com uma bonita janela de canto, possuindo na fachada um brasão com as armas da casa real portuguesa. Neste local encontra-se instalado o Museu de Arte Sacra.
Logo ali ao lado, fica a Casa da Roda. Uma casa típica transmontana, com escadas exteriores que conduzem a um alpendre. Ao lado da porta há uma pequena janela com a data de 1785, onde estava instalada a “roda”. A mãe, ou a pessoa por ela indicada, colocava a criança no receptáculo, rodava-o, e dava um sinal (dando pancadas na roda ou na porta) para avisar que estava um bebé na roda. A criança era recolhida pelo interior sem contacto visual com quem estivesse na rua. Os expostos eram entregues a amas e aí permaneciam até aos sete anos. A partir dessa idade, fazia-se a integração das crianças indo servir como criados ou entregues a oficiais de mestres como aprendizes. Hoje este edifício funciona como núcleo museológico. Ainda antes de chegar à Câmara Municipal, podemos encontrar a Capela do Sagrado Coração de Jesus.
Torre de Moncorvo
O edifício dos Paços do Concelho, bem como o edifício dos correios estão construídos no espaço que seria ocupado pelo Castelo. Descendo as escadas de volta ao largo do chafariz, do lado direito, ainda podemos ver a Porta da Traição. O chafariz presente do centro da praça apresenta três peças do tanque de água do original, construído durante a dinastia dos Filipes (em 1636), tendo sido, posteriormente, construído já em 1999. Este chafariz tinha por principal finalidade abastecer a população, através da água captada na serra de Roboredo.
Tempo ainda para uma visita ao Núcleo Museológico de Fotografia do Douro Superior que apresenta uma cronologia das principais inovações da história da fotografia; um importante espólio com fotografias dos principais monumentos do Douro Superior, bem como retracta os diversos trabalhos agrícolas, a exploração mineira na serra de Roboredo e dos caminhos-de-ferro; apresenta ainda uma valiosa colecção de aparelhos fotográficos que remontam ao século XIX e diversos acessórios. E para finalizar, visite o Museu do Ferro e da Região de Moncorvo onde ficamos a saber que a serra de Reboredo apresenta o maior jazigo de minérios de ferro (hematite e magnetite) da Europa e que se encontra por explorar (por notícias que li, um consórcio português-inglês irá começar em breve a exploração deste minério). No entanto, a exploração mineira não é novidade em Torre de Moncorvo: Entre 1951 e 1985 houve minas com exploração industrial e, muito séculos atrás, já os Romanos exploravam as minas e jazigos da serra de Reboredo.
Era altura de regressa à estrada, seguir a nacional 220 até ao IP2, para depois voltar a cruzar o rio Sabor junto à barragem do Baixo Sabor e tomar o IC5 até Vila Flor.
Conhecida como a Capital do Azeite, Vila Flor está no coração da Terra Quente Transmontana. Situada no denominado Vale da Vilariça, Vila Flor está rodeada por terras férteis e, por aqui, ainda se vive da agricultura.
A chegada à vila faz-se pela “rotunda do relógio”, e ao entrar na vila a primeira coisa que me saltou à vista foram… obras! Vila Flor estava transformada num verdadeiro estaleiro com edifícios, ruas e praças com obras a decorrer. Até o edifício da Câmara Municipal estava em obras… Mas, apesar de todas as obras que decorriam no centro da vila, Vila Flor pareceu-me bastante agradável e interessante, com o seu rendilhado de ruas a apresentarem alguns solares e casas brasonadas.
Vila Flor chamava-se Póvoa de Além Sabor, quando D. Dinis por aqui passou. E reza a história que o monarca terá ficado maravilhado e rendido aos encantos de tão bela paisagem que lhe mudou o nome e lhe concedeu foral em 1286 mandando que ali se construísse um castelo. Mais tarde, D. Dinis manda erguer em redor da vila uma cinta de muralhas com cinco portas. Desse património já apenas resta a Porta do Sol, ou o Arco de D. Dinis.
Percorrendo as ruas de Vila Flor encontramos a Matriz, ou Igreja de São Bartolomeu, um templo do século XVIII, de fachada imponente que terá sido construído em substituição da igreja anterior que desabara em 31 de Janeiro de 1700. A igreja possui dois retábulos mais antigos que o próprio edifício, preciosas obras de arte do século XVII.
No largo fronteiro à Igreja encontra-se o Pelourinho de Vila Flor, datado do século XVII. A vila apresenta ainda a Igreja da Misericórdia e várias Capelas. À entrada da vila está a imponente Fonte Romana.
Vila Flor: Fonte Romana e Igreja Mariz com o Pelourinho
Como é costume nestas coisas, o tempo já começava a escassear e ainda faltava muito para ver. Havia que seguir viagem IC5 fora até Alijó, já no distrito de Vila Real.
O concelho de Alijó estende-se a partir da margem direita do rio Douro e apresenta terrenos bastante férteis. Concelho essencialmente agrícola, é nos seus montes e vales que as vinhas ganham destaque e dão um toque especial na sua paisagem. Alijó também é conhecido por ser terra de laranja; segundo os seus habitantes, a melhor de Portugal…
A presença humana em Alijó é conhecida de há muito tempo. Prova disso mesmo são os diferentes testemunhos do seu povoamento: pinturas rupestres, castros e vestígios de vias romanas.
No século VIII, após a Reconquista, a primeira paróquia a ser criada na região, foi a de Alijó. Muito provavelmente, sucedendo a uma outra da época anterior à invasão árabe. Mais tarde, no século XIII, D Sanco II atribui foral a Alijó e, já no século XIV, D. João I concedeu Alijó a Álvaro Pires de Távora (nome que nos persegue por estas bandas…), passando os Távoras a ser donatários de Alijó. Já no século XVIII, com a morte dos marqueses de Távora, por suspeita de envolvimento na tentativa de assassinato de D. José I, Alijó foi incorporada nos bens da coroa.
Na vila destaca-se o edifício da Câmara Municipal, uma construção barroca do século XVIII, que apresenta na sua fachada o brasão real, com as cinco chagas e os sete castelos encimado pela coroa dos Duques de Bragança. Este brasão foi picado pelos soldados aquando das Invasões Francesas, que mandaram ali pintar as águias napoleónicas.
Mesmo ao lado da Câmara Municipal, no centro histórico da vila, existe um amplo largo onde se encontram o chafariz da vila, a igreja Matriz e, por detrás desta, ergue-se um plátano centenário, que terá sido plantado em 1856. A árvore tem cerca de 30 metros de altura e 6 metros de diâmetro.
A Matriz de Alijó é uma construção barroca datada de finais do século XVIII. Apresenta uma imagem de Santa Maria Maior em pedra e ricos retábulos de talha policromada e dourada. Calcula-se que os seus azulejos apenas tenham sido colocados durante o final da década de 40 do século passado.
Num breve passeio pelas ruas da vila ainda se pode admirar a Capela da Misericórdia, o Pelourinho da vila, bem como a estátua de homenagem ao Homem do Douro, numa das principais rotundas de Alijó.
Infelizmente, o tempo neste último dia de estrada não estava a ajudar. Após dois dias de excelentes temperaturas e tempo (bastante) quente, a chuva fez questão de nos visitar e, o que começou por ser uns aguaceiros, tornou-se em chuva intensa – fenómenos atmosféricos que acontecem com alguma regularidade em terras do interior após alguns dias muito quentes. Assim, o itinerário foi encurtado e, por visitar, ficaram Favaios e Sanfins do Douro. Certamente, locais a conhecer numa próxima viagem pelo Douro Vinhateiro…
Apesar das distâncias, o nordeste transmontano já não está tão inacessível como há uns anos atrás. As estradas eram más, tornando as viagens entre as diferentes localidades mais longas e verdadeiras tormentas (eu ainda cheguei a fazer algumas dessas viagens, não para Trás-os-Montes, mas entre Lisboa e o Alto Minho, onde a auto-estrada apenas existia num pequeno trajecto e eram necessárias muitas horas para fazer uma viagem). Mais tarde com o encerramento das linhas de caminho-de-ferro, na década de 80 e 90, a situação ficou ainda pior. Nos últimos tempos tem havido investimento em infra-estruturas rodoviárias e as coisas estão bem melhores. Hoje chega-se (mais) depressa ao nordeste transmontano, por isso é necessário por pés ao caminho, ou melhor, fazer-se à estrada. É preciso ir lá, conhecer a história e a cultura, conhecer e conviver com gente simpática e que sabe receber forasteiros como em poucos lugares. É preciso percorrer os montes e vales, contemplar a beleza dos rios e deixar-se deslumbrar com as magníficas paisagens. O nordeste transmontano tem outro encanto!
Linha de Terra ficou alojado na Quinta do Barracão da Vilariça, uma unidade de alojamento de agro-turismo inserida no meio de uma grande quinta agrícola com 120 hectares. Desde 1850 que a Quinta serve os viajantes como estalagem da malaposta da estrada real entre Bragança e Lisboa. É, por isso, uma casa com muita história.
Recebidos pelos proprietários da Quinta, aqui entra-se como visitas e sai-se como Amigos que um dia voltarão. Um casal super simpático e atencioso, de coração grande, que nos conta muitas histórias, nos dá informações preciosas e nos põe sempre bem-dispostos. Ah!... Até os cães são carinhosos e atenciosos que nos recebem com mimos logo pela manhã e nos fazem companhia nas caminhadas pela Quinta.
Aqui pratica-se uma agricultura em modo biológico e sustentado, utilizando de forma racional os recursos naturais renováveis (a propriedade tem o selo Green Key – um galardão internacional que distingue estabelecimentos que promovam o turismo sustentável, que implementam boas práticas ambientais e sociais e que promovem a educação ambiental para a sustentabilidade).
Localizada em pleno Vale da Vilariça (entre os concelhos de Vila Flor e Alfândega da Fé), no coração do nordeste transmontano, a Quinta do Barracão da Vilariça oferece o melhor da hospitalidade transmontana, aliando conforto, autenticidade e tranquilidade.
Numa zona de transição entre a Terra Quente e a Terra Fria transmontana existe um enorme vale que parece ter sido moldado para deliciar os nossos olhos com tamanha beleza: é o Vale da Vilariça, uma das zonas mais férteis do território nacional. O Vale da Vilariça corresponde a uma falha tectónica e é atravessado por várias linhas de água, o que leva a que a água se infiltre, atravesse camadas de rocha e que fique armazenada tornando estes terrenos bastante férteis. Este belíssimo vale, que se estende pelos concelhos de Vila Flor, Alfândega da Fé, Mogadouro e Torre de Moncorvo é ainda uma importante linha migratória para as aves devido aos cursos de água e albufeiras existentes. Só por curiosidade, é neste vale que se encontra a captação e a fábrica das águas Frize.
A Quinta, para além de terrenos de cultivo agrícola e pastagens, apresenta uma vasta área de olival e de amendoeiras. Aqui produz-se vinho, azeite e amêndoa, entre outros produtos. A propriedade possui um moinho hidráulico com mais de 200 anos de existência e que se encontra em perfeito estado de conservação e, ainda, uma zona de caça turística.
A Quinta do Barracão da Vilariça dispõe de 16 quartos com todas as comodidades distribuídos pelos edifícios da Quinta. Possuindo quartos no edifício principal, onde residem os seus proprietários, disponibiliza também alojamentos independentes e isolados com piscina comum – a Casa do Cereal e a Casa da Maquia. O edifício principal, para além de sala de refeições e sala de convívio, dispõe de um amplo relvado, piscina, parque infantil e uma loja de venda de produtos tradicionais, onde se destacam o queijo, o azeite e o vinho produzidos na quinta. Para mais informações consulte https://terra-sa.com.
Linha de Terra pagou todas as despesas para a realização desta road trip, bem como o alojamento na Quinta do Barracão da Vilariça.
Bejita a la cidade de Miranda de l Douro
(Texto em Língua Mirandesa)
Seguiu-se camino, por stradas secundárias an direçon la Miranda de l Douro, passando puls lugares de Uba, Granja i San Pedro de la Silba até se atingir outra beç l IC5 i la nacional 221 que ne ls lieba até Miranda de l Douro. Al chegar la Miranda de l Douro deparamos culas placas de las localidades (i de ls nomes de las rues) scritas an pertués i mirandés. La léngua mirandesa ye ua léngua pertencente al grupo asturo-leonés, cun statuto de segunda léngua oufecial an Pertual zde 1999. Ye falada por menos de quinze mil pessonas, grande parte nas aldés de Miranda de l Douro, Bumioso, Mogadouro, Macedo de Cabalheiros i Bergáncia.
Mas antes de percorrer las rues de l centro stórico de Miranda de l Douro, habie ua outra paraige: l miradouro de San João de las Arribas, yá ne l Parque Natural de l Douro Anternacional.
L Parque Natural de l Douro Anternacional abrange la ária an que l riu Douro custitui frunteira antre Pertual i Spanha, abrangendo ls cunceilhos de Miranda de l Douro, Mogadouro, Frezno de Spada a la Cinta i Figueira de Castielho Rodrigo.
Era anton, altura de passar por Miranda i seguir an direçon la Aldé Nuoba ó Aldinuoba, an mirandés, pus ye eiqui acerca qu'eisiste un miradouro spetacular. Eiqui, ne ls purmeiros quilómetros an território nacional, l Douro corre, apertado, an perfundos bales talhados na peinha, eisistindo scarpas que chegan a atingir ls 700 a 800 metros d'altura l que tornan esta magnífica paisaige única (i, por bezes, bertiginosa).
Ne l fin de l'aldé hai que seguir por un stradon an tierra para chegarmos a l'ermida de San João de las Arribas. San cerca de 900 metros para tener ua bista soberba subre l riu Douro que corre, alhá ne l fondo, purfeitamente ancaixado antre scarpas de cortar la respiraçon. Cuntornando la pequeinha ermida, eisiste un pequeinho camino que ne ls lieba mesmo até a la stremidade de l faia sin qualquiera proteçon (nun acunselhable la quien tubir porblemas cun alturas, yá que quando se mira alhá para baixo la sensaçon ye, ne l mínimo, stranha). San cerca de 700 metros de “parede” quaije na bertical que trasportan l nuosso mirar até al leito de l Douro. Ampressionante!
Depuis dun pequeinho çcanso, hai que cuntinar biaige an direçon la Miranda de l Douro (Miranda de L Douro). Stacionado l carro junto a l'antrada de l centro stórico, era altura de percorrer las rues de la cidade la pie.
Nun se sabe mui bien quando ampeçou l poboamiento de Miranda de l Douro, mas sabe-se que fui acupada pelou mouros ne ls ampeços de l seclo VIII i l sou castielho yá eisistia aquando de la formaçon de l Cundado Portucalense (1095), tenendo sido restourado a mando de D. Fonso Heinriques ne l seclo XII de l qual, hoije, solo eisiste la sue torre de menaige i alguns panhos de muralha que durante anhos serbiu de defesa contra las ambestidas de leoneses i castelhanos. L castielho fui reforçado por D. Dinis i, mais tarde, por D. João IV. Dende para acá, Miranda de l Douro andou quaije siempre an guerra culs spanholes. Na Guerra de ls siete Anhos, cula spluson dun paiol de pólbara (1762), parte de la cidade quedou çtruída. Recentemente, fúrun çcubiertas alguas partes de l castielho que stában subterradas. San bien besibles las scabaçones al lado de a torre de menaige. I depuis, benirun las ambasones francesas…
La majestosa catedral de Miranda de l Douro, custruída ne l seclo XVI, apersenta-se majestosa culas sues dues torres i ua abóboda de granito. La catedral, mandada custruir por D. João III, ye l maior templo relegioso de la region de Trás-los-Montes i amplicou la çtruiçon de l'antiga eigreija de Santa Marie, un tiempo erigido durante l reinado de D. Dinis, ne l seclo XIV.
La catedral, ne l sou anterior, ye bastante rica de talha dourada i retábulos. L'altar-mor apersenta un retábulo renacentista cumpuosto por 56 eimaiges bíblicas an alto-relebo. La catedral cunserba l guapo uorgon de época joanina i ye tamien coincida por guardar un ícone de la cultura relegiosa popular, l Nino Jasus de la Cartolinha datado de meados de l seclo XIX, que simboliza ua lenda que remonta a la Guerra de la Restouraçon (seclo XVII). Cunta la lenda que, an 1711, l'eisército castelhano ambadiu Miranda de l Douro. Quando la cidade se ancontraba cercada puls castelhanos, sperando por reforços que tardában an chegar, un rapazinho, bestido de fidalgo, terá andado a percorrer las rues de la cidade de spada an punho, atiçando la coraige de ls sous habitantes, paralisados de friu, fame i medo, para fazíren frente als spanholes que cercában la cidade. L nino abança antrépida contra ls spanholes çcendo costielha a baixo als berros. L pobo, armado de fouces, gadanhas, barapaus i alguas spingardas terá perseguido l nino anquanto l'enimigo dá an retirada. Treminada la batailha, depuis de la cidade libertada, percurou-se l nino por to l lado, mas esta tenie zaparecido. Ls mirandeses cunsidrórun que se tratara un milagre i mandórun sculpir ua eimaige de l Nino Jasus bestido de fidalgo i colocórun nel na catedral.
Mesmo al lado de la catedral eisiste un miradouro (parte del an obras) cun ua bista ampla subre l Douro i subre Spanha, na outra borda. Atrás de la catedral queda l'antigo Paço Eipiscopal (tamien an obras) que terá ardido pouco depuis de tener sido custruído (seclo XVIII), restando solo l'andar térreo cun ua arcada. I, lougo eilhi al lado, queda la biblioteca municipal que se ancontra anstalada ne l'antigo Cumbento de ls Frades Trinos (seclo XVII), tamien coincidos por Frades Çcalços de la Orde de la Santíssema Trindade, qu'ampeçórun a aparecer ne l Nordiste Strasmuntano, por altura de l'anho de 1474.
Nun deixe de calcorrear las rues ampedradas de la cidade i admirar alguas habitaçones mediebales i antigos solares. Ne l'ancho D. João III, junto a la Cámara Municipal, puode bejitar l'eigreija de la Misericórdie i las státuas an houmenaige a la tradecional cápia d'honra, feita an burel i ricamente decorada cun bordados. Depuis de bejitar l Museu de la Tierra de Miranda, çça la rue até a l'antiga Puorta de la Cidade. Se tubir tiempo, passeie pul aprazible parque ourbano de l riu Fresno i çça até a la beira riu, admire la barraige de Miranda i, se yá houbir, deia un passeio de barco pul Douro Anternacional.
Anfelizmente, nun tube ouportunidade de ber las beilças de ls Pauliteiros, mas Miranda de l Douro ye un local agradable, cheno de stória i de cultura, que bal la pena bejitar. Ne l cunceilho de Miranda de l Douro ancontran-se dous de ls maiores amprendimientos heidroelétricos pertueses, ambos ne l Douro Anternacional, la barraige d Miranda (ampeçada an 1956) i la barraige de l picote (1954).
#roadtrip #nordestetransmontano #bragança #alfandegadafe #penasroias #algoso #mirandadodouro #picote #mogadouro #torredemoncorvo #vilaflor #alijo
Comments