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  • Foto do escritorJoão Pais

Colónia Agrícola de Vascões

Atualizado: 13 de abr. de 2021



A Colónia Agrícola de Vascões, no concelho de Paredes de Coura, foi mandada construir por Salazar nos anos 50 do século passado. O projecto foi, e continua a ser, considerado como um dos exemplos perfeitos do modernismo português.

Instalada num local povoado desde tempos pré-históricos, como se comprova pela existência de diversas mamoas que constituem o Núcleo Megalítico de Chã de Lamas, a Colónia Agrícola de Vascões pretendia instalar colonos numa zona de baldios e transformá-la em zona agrícola.


Em 1936, durante o Estado Novo, foi criada a Junta de Colonização Nacional, um organismo oficial, dependente do Ministério da Economia, que tinha como missão colonizar os terrenos baldios (públicos e privados) que beneficiassem de infra-estruturas hidráulicas e fomentar a actividade agrícola em Portugal.

Nos anos que se seguiram, a Junta de Colonização procedeu ao levantamento e cadastro dos baldios e fez um estudo do potencial agrícola dos solos. Na altura, concluiu-se que a maior parte dos baldios existentes não eram adequados à agricultura, como se pode ler no Diário da República de 23 de Novembro de 1962, onde, na altura, se rectificava o regime jurídico da colonização interna: «(…) o inventário dos baldios do continente a que a Junta de Colonização Interna procedeu, veio revelar quanto era falaz a ilusão de que se dispunha ainda na metrópole de áreas apreciáveis passíveis de aproveitamento agrícola. […] A realidade, traduzida em números, revela que existe no continente uma superfície inculta de apenas 624 000 ha, dos quais 602 000 ha com aptidão exclusiva ou predominantemente florestal e mais 22 000 ha de aluviões salgados de recuperação difícil, demorada e muito cara. A superfície continental sujeita a cultura agrícola reduz-se a pouco mais de 4 milhões de hectares – e só 10 por cento desta área, aproximadamente, estão beneficiados pelo regadio.»

O modelo de reestruturação agrícola do país havia de ser criado em 1948. Pretendia-se instalar trabalhadores rurais em colónias agrícolas providenciando aos colonos casas de habitação com terreno para cultivo. Assim, António de Oliveira Salazar, através da Junta de Colonização Interna, mandou preparar os terrenos para receber os colonos. O regime oferecia casa, terreno de cultivo e sementes para a primeira campanha. Em troca, os colonos entregavam ao Estado um sexto da sua produção.

Na altura, ficaram definidas sete colónias agrícolas: Boalhosa (no Alto Minho), Alvão (em Vila Pouca de Aguiar), Barroso (Montalegre e Boticas), Gafanha (Ílhavo), Milagres (Leiria)

Santo Isidro de Pegões (Montijo) e Martim Rei (Sabugal).

A colónia agrícola da Boalhosa foi a última das sete previamente definidas a ser construída. No plano inicial, elaborado pela Junta de Colonização Nacional, estava previsto uma vasta área que abrangia dois núcleos: o da Lameira do Real, que envolvia Arcos de Valdevez e Monção, e o de Vascões, em Paredes de Coura. No entanto, foi apenas em Paredes de Coura que o projecto saiu do papel.

O projecto urbanístico da Colónia para além de água canalizada, sistema de combate a fogos e sistema de rega dos campos, contava com 15 casas geminadas para 30 famílias distribuídas por três arruamentos: a Rua de Cima, a Rua do Meio e a Rua de Baixo, uma escola primária, a casa do professor, um forno comunitário, uma capela e um posto médico. O forno, a capela e o posto médico nunca saíram do papel e nunca chegaram a ser construídos. A Colónia Agrícola de Vascões veria chegar os primeiros colonos em 1957.

O objectivo do Estado Novo consistia em tornar terrenos baldios e improdutivos em campos agrícolas onde seriam produzidos, entre outros, batatas, centeio e milho. Pretendia-se, assim, aumentar a produção agrícola do país que, na altura, lutava com carências alimentares e, ao mesmo tempo, tentava-se fixar as gentes à terra. O trabalho era muito duro. Era preciso transformar os baldios em terrenos de cultivo, foi preciso desbravar grandes áreas de matagal e partir e retirar muita pedra. Tudo feito à mão com pás e sacholas e muita força de braços. Muitos não aguentaram e emigraram. Em 1971, eram apenas dez as famílias que ainda permaneciam na Colónia de Vascões. Em 1988, com a extinção do projecto, o Estado vendeu as casas e as terras a quem quis continuar em Vascões.

Apesar de estar inserida numa encosta de grande beleza paisagística, com vistas deslumbrantes a toda a sua volta e com ar puro que nos enche os pulmões de vida, a Colónia de Vascões não respira saúde. Hoje os ex-colonos já são poucos e, embora se diga que por ali ainda habitam cerca de 50 pessoas, numa rápida visita pelos três arruamentos não vislumbrei mais do que meia dúzia de pessoas, todas idosas. Avistei alguns carros estacionados, o que indica que por ali ainda mora gente. As habitações estão, na sua maioria degradas e, muitas delas abandonadas e, embora em volta da ex-colónia se vejam terrenos de cultivo – na sua maioria pastagens, grande parte das pequenas hortas estão ao abandono. Aqui e ali nota-se que houve uma tentativa de recuperar as casas, nalguns casos desfigurando completamente a sua traça inicial.

Com a extinção da Colónia a escola primária e a casa do professor deram lugar ao Centro de Educação e Interpretação Ambiental (CEIA), aberto em 2007.

Mesmo em frente à ex-colónia, num dos pontos mais altos do concelho de Paredes de Coura, inserido numa vasta zona de paisagem protegida, fica o miradouro do Corno de Bico, um excelente e aprazível local para admirar a Colónia Agrícola de Vascões e desfrutar das amplas vistas que daqui se podem contemplar.

A Câmara Municipal de Paredes de Coura tem projectos para esta zona e pretende preservar toda a memória deste núcleo histórico, que foi exemplo do modernismo português, e tornar Vascões num museu vivo. Num dos arruamentos, numa placa em azulejos, pode-se ler os seguintes versos: “Pedi a Deus um conselho / Para encontrar alegria / Deus mostrou-me a terra e disse / Trabalha, semeia e cria...”. Por aqui já muito se trabalhou, já muito se semeou, agora, talvez seja chegada a hora de criar. Criar algo que preserve e perdure a história e as memórias deste local e das suas gentes.


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