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  • Foto do escritorJoão Pais

Casal de São Simão



Hoje vou-vos escrever sobre um local fantástico. Eu diria mesmo que é um segredo bem guardado. É uma combinação (quase) perfeita entre uma aldeia recuperada pelo Homem e a Natureza que recupera o ser humano. A harmonia entre a humanização de um espaço e a essência da natureza no seu estado quase selvagem.

Já lá estive algumas vezes – é um dos meus spots favoritos quer para relaxar, quer para um bom mergulho refrescante – e também, aqui no blog, já referenciei o local por duas vezes, primeiro como Hot Spot e, depois como Aldeia de Xisto para Desconfinar. Agora que regressei a este destino fantástico a aldeia merece o devido destaque.


Casal de São Simão é uma pequena aldeia no concelho de Figueiró dos Vinhos de onde dista cerca de dez quilómetros, bem no centro de Portugal continental. O acesso à aldeia está bastante facilitado já que fica a cerca de cinco minutos da A13 (saída 24) e a dois do IC8 (saída 19).

A aldeia é um pequeno aglomerado de habitações, com cerca de uma vintena de casas, muito juntas, que se foram acomodando ao longo da rua inclinada no cume de uma encosta da serra de São Simão ladeada, em cada uma das suas vertentes, pela ribeira de Alge e pela ribeira do Fato. A aldeia estende-se por cerca de 200 metros, praticamente por uma única rua, com vistas deslumbrantes para as colinas em seu redor, nomeadamente para as Fragas de São Simão e para os seus novos passadiços.

As bonitas casas da aldeia acomodam-se ao longo da sua única rua


As casas da aldeia, empoleiradas na crista da serra, com o seu tom amarelado, destacam-se do vasto manto verde que as evolve. São feitas com pedra da região, essencialmente o quartzito, e foram recuperadas mantendo a sua traça e características originais e próprias da região. A aldeia que outrora já fervilhou de vida, não deve contar com mais de três ou quatro habitantes permanentes, o restante foi convertido em alojamentos turísticos ou em segundas habitações que ganham outra vida aos fins-de-semana e no período de férias.

Apesar da visita (muito ordeira e disciplinada) das crianças de um infantário aquando da nossa visita, aqui reinam a paz e o sossego. O silêncio, o ar puro da serra e uma serena tranquilidade que se vai apropriando do nosso corpo, levam-nos a tomar uma atitude contemplativa. Esquecemo-nos da correria do dia-a-dia da vida citadina e… esquecemo-nos das horas que passam. Só o sol quente – sim, porque o astro-rei já vai alto e, aqui, depois de descobrir da névoa matinal “bate forte” – nos faz acordar deste entorpecimento natural e bom.

Calcula-se que Casal de São Simão tenha origem medieval, embora existam alguns indícios de ocupação pré-histórica nas imediações da aldeia.

Antigamente este era um local fértil, região de pecuária e pesca, Casal de São Simão era habitada por homens e mulheres que retiravam da terra o seu sustento e, no século XIX havia por aqui muitos lagares de azeite e moinhos de vento, aproveitando a implantação da aldeia numa posição elevada.

Naquela altura, rebanhos de cabras e ovelhas pastavam por estes montes e a aldeia tinha as suas hortas junto à ribeira do Fato onde, com a ajuda de bois e burros, as suas gentes semeavam e colhiam o seu sustento. Junto à ribeira de Alge, nos moinhos, mós de pedra moíam os cereais para, depois, se cozer o pão em fornos de lenha. Com a chegada dos “novos tempos”, durante as décadas de 50 a 70 do século passado homens e mulheres começaram a partir em busca de uma vida melhor. Aos poucos a aldeia foi ficando deserta e as suas casas começaram a cair.

A aldeia esteve próximo da ruína e do abandono total até que, há cerca de duas décadas, um homem que regularmente passava em trabalho na estrada que o levava a Figueiró dos Vinhos, resolveu fazer um desvio e parar nesta pequena aldeia que já antes lha havia chamado a atenção. Encontrou uma aldeia praticamente deserta e das 21 casas existentes, apenas quatro continuavam habitadas e as restantes em ruínas. Este homem era Albino Quinta, que de imediato se apaixonou pelo local e, em pouco tempo comprou ali uma casa. Com o tempo foi convidando os amigos a visitarem o lugar e também eles ali quiseram uma casa. Depois vieram os amigos dos amigos, e por aí fora. Aos poucos, com o esforço de todos, a aldeia foi-se reconstruindo e ganhando vida. São os novos aldeões que vieram das grandes cidades para aqui encontrar sossego e qualidade de vida.

Hoje já não há campos cultivados, apenas algumas árvores de fruto e algumas oliveiras a fazer recordar os tempos dos lagares de azeite, mas a aldeia ganhou uma nova vida, uma vida voltada para a natureza e para o turismo.

Mais tarde, houve o interesse da Câmara Municipal e da rede Aldeias do Xisto. Hoje Casal de São Simão é uma das mais bonitas e preservadas aldeias de xisto e é uma das 27 que integram o projecto Aldeias do Xisto.

Casal de São Simão conta com uma loja das Aldeias do Xisto onde se pode adquirir artesanato e produtos regionais e também com o afamado restaurante Varanda do Casal, com vista panorâmica sobre a aldeia e excelente cozinha tradicional da região.

Apesar de pequena, Casal de São Simão e a envolvente à aldeia apresentam algum património muito interessante. Para além da riqueza das suas casas típicas em pedra, devidamente recuperadas, podemos encontrar logo que se começa a descer a rua, do lado esquerdo, uma habitação que na sua padieira apresenta a inscrição da data de 1701, provavelmente a casa mais antiga da aldeia.

Continuando a descer a rua, um pouco mais abaixo, do lado direito, vamos encontrar o fontanário da aldeia. Continuando a percorrer a rua podemos observar que algumas casas mantêm as características de outrora, com as pedras no topo das chaminés ou as prateleiras em pedra ao lado das janelas, que servem para alegrar as casas com bonitas e coloridas flores. Aliás, toda a aldeia se encontra embelezada quer com flores coloridas quer com motivos que nos remetem para os tempos em que se ouvia o rodado dos carros de bois rua acima e a vida fervilhava por estes lados.

De regresso ao cimo da rua, no ponto de encontro da aldeia, encontramos a Eira e o Forno Comunitário, testemunhos de práticas que no passado mantinham vivas as raízes agrícolas dos habitantes de Casal de São Simão.

À entrada da aldeia encontramos, quase no topo do monte de São Simão (350 metros de altitude), a Ermida de São Simão, edifício simples e de linhas bastantes sóbrias, datado do século XV e, posteriormente, ampliado durante o século XVII. A Ermida é dedicada a São Simão e a São Judas Tadeu. Este é o mais antigo templo do concelho de Figueiró dos Vinhos.

Na EM525 que liga a aldeia ao miradouro das Fragas de São Simão, encontramos uma ponte sobre a ribeira de Alge que, segundo os entendidos, é uma ponte de origem Romana mas, entretanto, já muito modificada com sucessivas obras de recuperação e alargamento da estrada, daí passar despercebida aos olhos do normal viajante.


Praia Fluvial das Fragas de São Simão
Praia Fluvial das Fragas de São Simão e o seu enquadramento bucólico

Não se pode falar de Casal de São Simão sem se referir a sua maravilhosa praia fluvial bem como as Fragas com a sua vista imponente e os recentes passadiços (inaugurados no ano passado).

Se vier com tempo e assim o desejar, a meio da rua do Casal existe um caminho que o lavará até à maravilhosa praia fluvial. É só seguir o trilho, não tem como se enganar (são cerca de 15 minutos a pé pelo meio do vasto manto verde que envolve a aldeia). Em alternativa, poderá “dar a volta” de carro, indo até ao miradouro das Fragas de São Simão (cerca de quilómetro e meio). Junto ao miradouro existe uma estrada até à praia… mas assim perde a experiência de fazer os passadiços… Eu optei por seguir de carro até ao miradouro depois de visitar a aldeia. Deixei o carro no estacionamento e fiz os passadiços até à praia fluvial onde dei um mergulho antes de voltar para cima.

A vista do miradouro é imponente e o local é fascinante. Daqui de cima temos uma vista sobre praia fluvial, a aldeia e sobre todos os montes à nossa volta. Os enormes blocos quartzíticos erguem-se a várias dezenas de metros, como se fossem gigantes a proteger a ribeira lá no fundo.

A ribeira de Alge que rompe por entre as Fragas e os Passadiços


No miradouro têm início os passadiços das Fragas de São Simão que nos levam até à praia fluvial e depois de novo até à aldeia. São cerca de 400 degraus que se fazem relativamente bem, pois a vista deslumbrante foca a nossa atenção e assim vai-nos abstraindo da quantidade de degraus.

Os passadiços são uma elegante estrutura em madeira e, confesso, até se enquadram na paisagem. No entanto, questiono a necessidade dos mesmos, já que mesmo ao lado dos passadiços existe uma estrada que nos leva até à praia. Sei que existe por aí uma “febre” de passadiços e uma vontade enorme de atrair pessoas a outros territórios, mas não vale tudo… não vamos construir passadiços onde já existem trilhos ou onde há estradas. Existem locais onde os passadiços são “necessários” para tornar os locais visitáveis e existem locais onde os mesmos eram desnecessários.

Descidos os cerca de 400 degraus, chegamos à praia fluvial. Apesar de todas as infra-estruturas (bar, esplanada, nadador salvador…), eu diria que esta é uma praia “selvagem”. Aqui a ribeira de Alge, corre num leito bastante irregular, rodeada por muitas árvores, formando um cenário idílico. As águas da ribeira, que correm a caminho do Zêzere, passam entre grandes blocos de rocha e rasgam os gigantescos blocos de quartzito, criando pequenas quedas de água e espaços muito atraentes e propícios para um banho nas suas águas límpidas. Cá de baixo o imponente tamanho das duas vertentes rochosas torna-se ainda mais majestoso à escala humana. É a beleza da Natureza no seu estado (quase) selvagem. É uma experiência impressionante atravessar o estreito dos dois afloramentos quartzíticos a nado. Um dos locais mais incríveis onde já nadei.



Casal de São Simão é um local apaixonante, quer pela beleza da aldeia com as suas casas recuperadas, quer pela riquíssima envolvente que nos remete para um quadro bucólico que a Natureza soube completar numa harmonia perfeita. Um pequeno paraíso repleto de surpresas a cada recanto. Um segredo bem guardado.



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