Hot Spot: Pulo do Lobo
- João Pais
- 30 de out.
- 6 min de leitura

Hoje trago um local singular onde podemos admirar a força e a beleza da Natureza. Um espectáculo natural imponente. Em pleno coração do Parque Natural do Vale do Guadiana, encontra-se um dos “segredos” mais impressionantes do sul de Portugal: o Pulo do Lobo.
Aqui, situa-se o ponto mais estreito do rio Guadiana, um local onde o rio se revolta e onde as suas águas se precipitam por uma estreita garganta, criando um som estrépito que ecoa pelas encostas. O Pulo do Lobo é um lugar de visita obrigatória para quem anda por estes lados, uma “jóia escondida” no imenso Alentejo que, certamente, vai ficar na sua memória.
O Pulo do Lobo é o ponto mais apertado do rio Guadiana, onde o seu leito se estreita abruptamente entre escarpas rochosas de xisto e quartzito, formando uma das maiores quedas de água do sul de Portugal e que, aqui, serve de limite territorial entre os concelhos de Mértola e de Serpa.
O Pulo do Lobo é um acidente geológico com mais de 10.000 anos, onde a rocha foi sendo “rasgada” pela erosão da água. Ao longo dos tempos, o rio foi escavando o leito rochoso e moldando a paisagem com a força das suas águas criando uma garganta profunda e sinuosa. Aqui, as águas cristalinas do Guadiana precipitam-se por uma “fenda” rochosa, muito estreita, numa queda de cerca de 16 metros, onde as águas rugem num mar de espuma para depois para darem lugar a um lago de águas serenas e silenciosas. Depois da queda de água, as águas ficam mais calmas numa espécie de “caldeirão” formado por rochas, chamado de Pego do Sável (onde algumas das espécies de peixes migradoras chegam para desovar, subindo o rio, vindas do mar). O Guadiana segue depois o seu curso para sul, para se encontrar com o Atlântico, junto a Vila Real de Santo António.

Esta “fenda” estreita por onde correm as águas do Guadiana, como que divide o leito do rio em duas partes distintas; antes mais largo e calmo e, depois do Pulo do Lobo, mais estreito e escarpado. Aqui podemos observar várias cavidades rochosas, as marmitas de gigante ou marmitas turbilhonares. Estes “buracos” de diversas dimensões, mais ou menos arredondados, são formados por acção do movimento turbilhonar da água que arrasta seixos, areias e outros sedimentos. É a prova de que água mole em pedra dura, tanto bate até que fura...
Este é o local onde as margens do Guadiana estão mais próximas, dizendo-se mesmo que seria possível, num único pulo, os lobos passarem de uma margem para a outra. Vem daí o nome do local.

O Pulo do Lobo está situado em zona protegida do Parque Natural do Vale do Guadiana, é o principal acidente geológico do rio Guadiana e é um geossítio de relevância nacional. É um local de grande beleza e imponência e que conserva uma importante biodiversidade. A sua vegetação é composta por várias espécies típicas dos habitats dos matagais mediterrânicos (murtas, zambujeiros, aroeiras, estevas, tojos, alecrim, tomilhos e rosmaninhos e diversas flores silvestres) e as escarpas altas e rochosas que envolvem o local servem de refúgio a espécies como a cegonha preta, o bufo real e a águia real. Por entre a vegetação densa, existe uma fauna muito diversa, onde se destaca o lince ibérico, mas onde também podemos encontrar lontras e javalis, entre outras espécies que encontram refúgio nas margens do rio.
O Pulo do Lobo é um local de lendas e histórias de contrabando que têm passado de geração em geração por tradição oral. Histórias que fazem parte do património imaterial da região e que contribuem para o fascínio que o Pulo do Lobo exerce sobre os visitantes. Conta-se que, em tempos antigos, um lobo perseguido por caçadores terá conseguido saltar de uma margem para a outra do desfiladeiro. A distância entre as duas margens, em certos pontos, é tão estreita que o salto, embora bastante improvável, não seja totalmente impossível – fantasia que tem vindo a alimentar a imaginação popular e de quem visita o local. Existem lendas que falam de pastores, criaturas míticas que habitam as profundezas do rio e amores proibidos. Uma dessas lendas conta-nos a triste história de um amor impossível entre uma princesa e um camponês. Na aldeia de Corte Gafo vivia uma princesa muito bela e, do outro lado do rio, vivia um camponês destemido que saltava o desfiladeiro para poder encontrar-se com a sua amada. Um dia, o jovem foi apanhado pelo rei, que o ameaçou se ele continuasse visitar a princesa. As ameaças não assustaram o rapaz que continuou com os seus destemidos saltos sobre o estreito do rio para visitar a bela princesa às escondidas. Um dia, o rei surpreendeu novamente o rapaz e chamou uma bruxa que lhe lançou um feitiço: “Se saltares novamente o rio, transformar-te-ás em lobo”. Esta ameaça não impediu que o rapaz continuasse a saltar as margens do rio para se encontrar com a sua amada, sob a forma de lobo. Quando rei descobriu que os encontros se mantinham, reuniu os seus homens e os seus cães e partiram em perseguição do rapaz. Os dois amantes fugiram na direção do rio e, quando lá chegaram, tentaram saltar para a outra margem, mas a princesa não alcançou o outro lado, caindo no desfiladeiro e desaparecendo nas águas revoltas do Guadiana. O rapaz não suportou a dor de perder o seu grande amor e lançou-se também no abismo, onde morreu, meio homem, meio lobo.

O acesso ao Pulo do Lobo é fácil e está bem sinalizado. Pode-se aceder ao Pulo do Lobo quer a partir de Mértola (cerca de 30 quilómetros), quer a partir de Serpa (perto de 40 quilómetros). Tanto de um lado, como do outro, os últimos 1.500 a 2.000 metros terão que ser feitos em estrada de terra batida. Do lado de Serpa (na margem esquerda do Guadiana) existem uns passadiços que acompanham o curso do rio. Os Passadiços do Pulo do Lobo (com cerca de um quilómetro) permitem contemplar a paisagem enquanto se desce a encosta de 50 metros ao longo dos seus cerca de 300 degraus. Eu optei pelo lado de Mértola, pois estava por lá.
A partir da vila de Serpa, há que tomar a estrada 265 em direcção às Minas de São Domingos. Seguir (cerca de 25 quilómetros) até à localidade de Vale de Poço, onde deverá virar à direita e continuar (mais dez quilómetros) até encontrar a indicação do desvio para o Pulo do Lobo. Existe uma outra alternativa, por estrada secundária (e estreita) que serve zonas agrícolas com campos de cultivo e olivais. São cerca de 20 quilómetros. Esta estrada (a M514, também conhecida por estrada de São Brás, por passar próximo à ermida com o seu nome) tem início junto ao hotel Pulo do Lobo, em Serpa.
A partir de Mértola, podemos chegar à margem direita do Guadiana seguindo a estrada nacional em direcção a Castro Verde (cerca de quatro quilómetros), para depois se virar à direita para a aldeia de Corte Gafo de Cima, seguir para Amendoeira da Serra e depois em direcção à herdade do Pulo do Lobo. O caminho está sempre bem sinalizado. Quando chegar à herdade pode abrir o portão, e voltar a fechá-lo depois de passar, para os animais (ovelhas) não saírem. Depois do portão são cerca de 1.500 metros em estrada de terra batida até ao Pulo do Lobo. Esta estrada de acesso à beira rio é bastante inclinada, pelo que, após algumas chuvas, poderá ficar em mau estado. Agora estava impecável. Apesar do carro poder ir até lá baixo (quando a estrada está em bom estado), recomendo que o deixe no pequeno largo antes do portão e seguir o caminho a pé (embora a subida de regresso seja penosa), para não causar perturbações quer nos animais, quer no próprio local.
Visitar o Pulo do Lobo requer alguns cuidados, principalmente se for acompanhado de crianças. Para além do perigo óbvio da queda de água, o terreno apresenta muitas irregularidades e diversas cavidades rochosas (marmitas de gigante). Acima de tudo, requer que se respeite o local e que tenha os cuidados “normais” para quem circula e caminha no meio de espaços naturais: não se afaste do caminho existente e não se aventure a caminhar em cima das rochas. Não faça barulho e não deixe lixo. Ah! E nem lhe passe pela cabeça tentar saltar de um lado para o outro… Não “vá atrás” de lendas, o espaço é mais largo do que parece.

O Pulo do Lobo é um local imperdível. Uma “jóia escondida” no nosso Alentejo. Um sítio absolutamente mágico, de grande beleza natural com a Natureza no seu estado puro, onde o tempo parece abrandar. O Pulo do Lobo é um lugar para visitar sem pressas; é um local que convida o visitante à contemplação, um lugar para admirar a Natureza em silêncio, escutar o rio e relaxar. Um lugar para sentir. O Pulo do Lobo é um local selvagem, poético e cheio de alma, um daqueles lugares que vamos recordar para sempre.
Recomendo visitar no início da Primavera ou após grandes temporadas de chuva (quando o caminho poderá ficar mais difícil) que é quando o caudal do Guadiana ganha uma força ainda mais impressionante. Dizem, que ao pôr do sol, a luz dourada reflete nas águas e nas rochas, criando um cenário quase místico.
Coordenadas GPS:
N 37º48.24558’ W 7º38.01216’
37,804093 -7.633536








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