O Cabo Espichel é um promontório agreste a cerca de 15 quilómetros da vila de Sesimbra. É um local isolado, inóspito, com falésias abruptas e com grande inclinação, mas de uma beleza grandiosa como a história do local.
Antes de mais, convém esclarecer que o Cabo Espichel é um promontório rochoso situado em frente ao farol (a cerca de 500 metros) onde existe um posto de observação (abandonado) e não propriamente no planalto onde se encontra o santuário da Senhora do Cabo.
O Farol do Cabo Espichel data de 1790, sendo um dos mais antigos da nossa costa. Mais de 200 anos depois da sua construção, o Farol mantém as suas funções e é um importante aliado das gentes do mar, nomeadamente dos pescadores de Sesimbra. Do alto da sua torre com 32 metros de altura a sua luz tem um alcance de 26 milhas, aproximadamente 48 quilómetros. Na sua construção original o edifício não seria tão grande, tendo o corpo anexo à torre sido aumentado para os lados em 1900.
Segundo alguns registos, muito antes da construção do actual Farol, no século XV já ali se acendia uma grande fogueira para servir de guia aos navegantes.
Pouco se sabe quanto ao seu equipamento primitivo, no entanto, existem registos (1866) que documentam que o Farol funcionava com 17 candeeiros alimentados por azeite. Mais tarde, em 1886, a sua luz passou a ser alimentada por petróleo em vez de azeite e, em 1926, seria electrificado através de geradores a petróleo. O Farol do Cabo Espichel só em 1980 foi ligado à rede eléctrica pública, passando então a funcionar com uma lâmpada de 1000 watts. Em finais de 1989 o Farol passou a ser totalmente automatizado.
Ali ao lado, junto ao Atlântico, no alto de uma ravina a cerca de 135 metros acima do nível do mar, destaca-se o Santuário de Nossa Senhora do Cabo - também conhecido por Santuário de Nossa Senhora da Pedra da Mua -, local de culto muito antigo com mais de 600 anos.
Empoleirada na arriba, debruçada sobre o azul do Atlântico, está a Ermida da Memória, a pequena capelinha onde terá começado a história do Santuário e que assinala o local onde, segundo a lenda, em 1410 terá aparecido a imagem da Virgem que deu origem ao culto da Nossa Senhora do Cabo. A Ermida foi construída para guardar a imagem da Virgem que há muito era venerada um cima do rochedo onde teria sido encontrada. Conta a lenda que dois homens, já com alguma idade, encontraram uma imagem de Nossa Senhora do Cabo e nesse mesmo local construíram uma Ermida.
A Ermida da Memória é o edifício mais antigo do conjunto que compõe o Santuário e desfruta de uma vista fabulosa sobre o azul do mar. O interior da Ermida está decorado com painéis de azulejos azuis e brancos do século XVIII que ilustram a história do culto a Nossa Senhora do Cabo, documentando a construção da ermida, das igrejas e das hospedarias, bem como a realização das peregrinações populares.
A crescente afluência de peregrinos fez com que a ermida se revelasse demasiado pequena e, em 1495, dá-se início à construção de uma primeira igreja da qual, hoje, não existe qualquer vestígio. O templo actual foi mandado construir pelo Rei D. Pedro II em 1701 e, seis anos depois, a imagem de Nossa Senhora foi transferida da pequena ermida para a nova igreja. Durante o século XVIII foram lançados sucessivos programas de ampliação da Igreja de Nossa Senhora do Cabo e são construídas as hospedarias para os romeiros entre outras dependências (em que se incluía, por exemplo, o pequeno Teatro de Ópera).
A igreja de Nossa Senhora do Cabo, com a sua fachada em granito, encontra-se de “costas” viradas para o mar e, em conjunto com as hospedarias, formam uma espécie de grande claustro aberto de um dos lados, protegendo os fiéis e romeiros dos ventos. As casas do santuário formam duas longas filas (com cerca de 150 metros) de janelas sobre uma arcada de pedra de ambos os lados da igreja. Estas casas encontram-se abandonadas, emparedadas para evitar ocupações ilegais (como já chegou a acontecer) e em mau estado, notando-se falta de conservação há muito tempo. É uma pena que estes edifícios não sejam (re)aproveitados.
Se a igreja estiver aberta, entre e aprecie o seu interior com uma dezena de altares, o relicário de prata, a abóbada e as pinturas a fresco. O tecto apresenta uma pintura em perspectiva.
Em frente ao santuário está a Casa da Água, uma pequena construção de forma hexagonal coberta por uma cúpula e uma pequena horta murada que, na altura, servia para abastecimento dos peregrinos.
A Casa da Água foi mandada construir pelo Rei D. José I, em 1770, e recebia a água trazida por um aqueduto (ainda visível e que vai ser recuperado) ao longo de 2,5 quilómetros desde a aldeia de Azóia. No seu interior, a Casa da Água conserva uma fonte em mármore com motivos escultóricos, bancos de pedra ao longo das paredes e restos de um silhar de azulejos. Para poder visitar tem que solicitar previamente no Turismo de Sesimbra.
Mesmo à saída do Santuário existe indicação para a Jazida de Pegadas de Dinossauros dos Lagosteiros, um praia de rochas soltas. São cerca de 850 metros por um caminho de terra (em muito mau estado para automóveis “normais” – eu cruzei-me com um pequeno todo-o-terreno, pelo que se não tiver um, deverá ir a pé) até à praia dos Lagosteiros.
Aqui, numa vasta área, existem pistas de pegadas de terópodes (dinossauros bípedes carnívoros) e de saurópodes (herbívoros) de grandes e pequenas dimensões que por ali passaram há cerca de 145 milhões de anos.
Uma destas pistas está associada e terá dado origem à lenda de Nossa Senhora da Pedra da Mua, segundo a qual uma mula transportou a Virgem da praia até ao cimo do Espichel, indo rocha acima e deixando as marcas dos seus cascos.
Para finalizar, deixo aqui um alerta para o facto de toda aquela zona apresentar falésias bastante instáveis, pelo que não é seguro aproximar-se demasiado da beira das falésias, como tive oportunidade de ver algumas pessoas fazer para conseguirem “aquela” foto – não há foto nenhuma que mereça o risco que se corre.
Coordenadas GPS:
Cabo Espichel
N 38º24.83802'
W 9º13.32036'
Santuário (parque de estacionamento)
N 38º25.19502'
W 9º12.77226'
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